Sábado, 17 de Maio de 2008
Ontem à noite, a praça do Município do Funchal encheu-se por completo para aplaudir a fadista portuguesa Mariza. Esta fez-se acompanhar dos seus músicos (agora, na guitarra portuguesa, Ângelo Freire, guitarra de fado, Diogo Clemente, na viola baixo, Marinho de Freitas, e na percussão João Pedro Ruela) e de um quarteto de cordas da Orquestra Clássica da Madeira.
O espectáculo foi promovido pela Câmara do Funchal e estava integrado nas comemorações dos 500 anos da cidade. Refira-se que a fadista aproveitou o convite para fazer uma pequena apresentação do seu novo trabalho “Terra”, cuja estreia oficial está prevista para 21 de Junho, na cidade de Santarém, seguida de uma digressão mundial. O novo álbum terá como single “Rosa Branca”, um fado dedicado a “Alfama”, um poema de Florbela Espanca – “Vozes do Mar”, (musicado apenas com viola de fado) e um tema de Maximiano de Sousa.
Do alinhamento do concerto constaram ainda temas como “Loucura”, “Chuva”, “Maria Lisboa”, “Meu Fado Meu”, “Barco Negro”, “Há uma música do Povo”, “Feira de Castro”, “Primavera”, e para finalizar em grande, “Ó gente da minha terra”.
Miguel Alexandre Palma Costa
Sexta-feira, 16 de Maio de 2008
«A lógica é a ciência positiva das leis do pensamento.
O que caracteriza essencialmente o pensamento é que ele ou é verdadeiro ou falso. Ora, o facto do conhecimento do qual se pode dizer ser verdadeiro ou falso é o juízo. No discurso, a proposição simples é o enunciado de um juízo: ‘A Terra é esférica’. Mas nem todos os discursos se apresentam deste modo: por exemplo, a oração, não sendo nem verdadeira nem falsa, não é o enunciado de um juízo, como não é também, falando com propriedade, um pensamento.
O juízo contém ideias, e ele próprio entra na composição dos raciocínios. As ideias são propriamente os objectos do pensamento. Designamo-las, a maioria das vezes, por adjectivos: vermelho, pesado, ou por substantivos: homem, leão, casa, ou por substantivos compostos: a flor campestre, o livro de Pedro, ou por verbos simples: corar, correr, cantar, ou por um verbo composto: cantar uma romanza. Mas corresponde uma ideia a todas as palavras do discurso que apresentam um sentido. [...]
O raciocínio não tem expressão gramatical, o que faz que não possamos apelar para o discurso de maneira a, partindo dele, evocar o pensamento. No sentido mais lato, é um conjunto de juízos de tal modo que, pelo facto de estarem aproximados, daí resulta necessariamente um ou vários outros juízos. A estes últimos chamamos conclusões.
Admitiu-se, durante muito tempo, que o plano duma lógica estava traçado pela ordem de composição que acabámos de descrever. Era necessário ir do simples para o complexo, isto é, da ideia para o juízo, do juízo para o raciocínio. A ideia era considerada como o elemento do pensamento. No entanto, todos os lógicos estão hoje de acordo ao considerarem o juízo como o ponto de partida do seu estudo. Note-se, em primeiro lugar, que ele constitui o primeiro conhecimento real: nem a palavra leão nem a palavra ruge correspondem a actos completos do pensamento. É preciso reuni-las numa proposição: o leão ruge, para com elas fazer um discurso. Nunca se pensa isoladamente uma ideia, e para a contermos numa asserção, interior que seja, é necessário uni-la a outras. O juízo aparece, pois, como o primeiro acto completo e correcto de conhecimento, visto que só ele possui verdadeiramente um sentido, e a ideia deve ser considerada como uma abstracção.»
Serrão, Joel; Grácio, R., Filosofia, Lisboa,
Livraria Sá da Costa Editora, 1972, pp. 4-5.
Segunda-feira, 12 de Maio de 2008
«Do que se trata é de levarmos a sério a liberdade, ou seja, de sermos responsáveis. O que há de sério na liberdade é que ela tem efeitos indubitáveis, que não se podem apagar quando isso nos convém, uma vez que tenham sido produzidos. Sou livre de comer ou não comer o pastel que tenho à minha frente; mas, depois de o ter comido, já não sou livre de o ter à minha frente ou não. Dou-te outro exemplo, desta vez de Aristóteles (já sabes, esse velho grego que falava do barco e da tempestade): se tiver uma pedra na mão, sou livre de ficar com ela ou de a deitar fora, mas se a atirar para longe já não poderei ordenar-lhe que volte para que eu continue com ela na mão. O que há de sério na liberdade é que cada acto livre que faço limita as minhas possibilidades quando escolho realizar uma delas. E não vale fazer batota e esperar para ver se o resultado é bom ou mau, antes de assumir se sou ou não responsável por ele. Desse modo, talvez seja possível enganar um observador exterior, como pretende a criança que diz “não fui eu!”, mas a nós próprios nunca nos podemos enganar por completo.
De maneira que aquilo a que chamamos “remorso” não é mais do que o descontentamento que sentimos connosco quando empregámos mal a nossa liberdade, quer dizer, quando a utilizámos em contradição com o que deveras queremos como seres livres, para o bem e para o mal: assumirmos as consequências do que fizemos, emendar o mal que possamos emendar e aproveitarmos o bem ao máximo. Ao contrário da criança malcriada e cobarde, o indivíduo responsável está sempre pronto a responder pelos seus actos: “Sim, fui eu”. O mundo que nos rodeia, se reparares, está cheio de ocasiões que podem servir ao sujeito para se desfazer da sua responsabilidade. A culpa do mal que sucede parece ser das circunstâncias, da sociedade em que vivemos, do sistema capitalista, do carácter que tenho (sou assim!), de não ter sido bem educado (ou me terem mimado em excesso), dos anúncios da televisão, das tentações que se oferecem nos escaparates, dos exemplos irresistíveis e perniciosos... Acabo de empregar a palavra-chave destas justificações: irresistível. Todos os que querem demitir-se das suas responsabilidades acreditam no irresistível, naquilo que subjuga sem remédio, seja a propaganda, a droga, o apetite, o suborno, a ameaça, a maneira de ser... qualquer coisa serve.»
Savater, Fernando, Ética para um Jovem, Lisboa, Editorial Presença, 1997, p. 75.
«A noção de responsabilidade parece-me ser uma noção ética para retomar e voltar a desenvolver, insistindo [...] num aspecto [...]: o da dívida cultural que cada indivíduo contrai ao vir ao mundo e ao viver. Ninguém existe, como indivíduo e como pessoa, sem ter uma imensa dívida para com a sua família, o seu ambiente, o seu meio, a sua sociedade, os seus avós, o seu património, os seus antepassados, em suma para com todos aqueles que o precederam. Esta ideia de dívida, esta ideia de que somos devedores, [...] é uma ideia que deve ser, cada vez mais, desenvolvida para contrariar a onda de individualismo. Falamos frequentemente do indivíduo, da pessoa como se ela estivesse absolutamente só, como se ela não fosse um ser sociológico. O discurso ético deve considerar a pessoa na sua totalidade humana e moral, como indivíduo e como ser social, como responsável pela sua vida e como devedora de uma herança imemorial.»
Rocher, G., “Le Défi Éthique dans un Context Social et Culturel en Mutation, in Philosopher n.º 16, 1994, pp. 14-15.