«Como viver da melhor maneira possível? Esta pergunta parece-me muito mais substancial do que outras na aparência mais imponentes: «Tem sentido a vida? Vale a pena viver? Há vida depois da morte?» Olha, a vida tem sentido e sentido único; segue em frente, as cartadas não se repetem nem podem, habitualmente, corrigir-se. Por isso devemos reflectir sobre aquilo que queremos e reparar no que fazemos. Depois... conservar sempre a coragem diante do fracasso, porque a sorte também faz parte do jogo e ninguém pode acertar em todas as ocasiões. O sentido da vida? Primeiro, procurar não falhar; depois, tentar falhar sem desanimar. Quanto a sabermos se vale a pena viver, remeto-te para o comentário a esse propósito de Samuel Butler, um escritor inglês, muitas vezes irónico: «Isso é uma pergunta para ser feita a um embrião, não a um Homem.» Qualquer que seja o critério que escolhas para julgar se a vida vale a pena, terás que o ir buscar a esta mesma vida na qual estás mergulhado. Mesmo que rejeites a vida, fá-lo-ás em nome de valores vitais, de ideais e ilusões que aprendeste no ofício de viver. (...). Acredito que qualquer ética digna desse nome parte da vida e se propõe reforçá-la, torná-la mais rica. (...). E interessa-me que esta vida seja uma vida boa, não uma simples sobrevivência ou um constante medo de morrer. (...)
Porque viver não é uma ciência exacta, como as matemáticas, mas uma arte, como a música. Podem, da música, aprender-se certas regras e podemos ouvir o que os grandes compositores criaram, mas se não tiveres ouvido, nem ritmo, nem voz isso de pouco te servirá. Com a arte de viver acontece a mesma coisa. (...)
A vida boa não é algo de genérico, fabricado em série, mas só existe por medida. Cada um precisa de a ir inventando de acordo com a sua individualidade, única, irrepetível... e frágil. No que se refere ao bem viver, a sabedoria ou o exemplo dos demais podem ajudar-nos, mas não substituir-nos.»
Fernando Savater, Ética para um Jovem, Editorial Presença, pp. 117-118