A palavra Política, proveniente do grego “Pólis” («cidade-estado»), diz respeito, em geral, ao governo dos homens e à administração das coisas, em particular, à organização e direção dos Estados.
Do ponto de vista académico, podemos enunciar que a política é por muitos considerada de três formas, ou melhor, abarca três significados algo distintos: primeiro, uma “arte”, a de governar a cidade (estado) de acordo com um projeto relativo ao/para o conjunto da mesma (por exemplo, revivo a expressão “ter uma política”, uma ideia aqui e agora que é possível efetivar); segundo, a política como uma atividade: “fazer política” é alguém empenhar-se na ação que pretende a tomada do poder para fazer triunfar as suas ideias; terceiro, e relembrando um acreditado pensador francês, Paul Ricoeur, a política como um domínio específico (distinto, por exemplo, do poder económico), “a política, como atividade gravitando em torno do poder, da sua conquista e do seu exercício”.
Ora, uma curta reflexão sobre o lugar da política hoje, em particular numa pequena região insular como é caso da RAM – e por que não estendê-la ao continente nacional – teria de passar pela célebre distinção entre teoria e prática. A este propósito, diz o ditado popular que «a teoria é uma coisa mas a prática é outra», e provavelmente nos assuntos da política também assim o é.
Em termos teóricos, Aristóteles (porventura o analista político mais perspicaz de sempre) refere a política como a “ciência suprema”, à qual as outras ciências estão subordinadas e da qual todas as demais se servem numa cidade, pois a sua tarefa seria investigar qual a melhor forma de governo e as instituições capazes de garantir a “felicidade coletiva”. Já mais contemporaneamente, o sociólogo e filósofo Julien Freund descreve a política como a «autoridade social cujo objetivo consiste em garantir pela força, geralmente fundada no direito, a segurança externa e a concórdia interna de uma unidade política particular». (Freund, J., L’essence du politique, Paris, Sirey, 1965, p. 751).
Se esta é a verdadeira natureza/essência da política, a sua prática, em tempos atrasados e ainda corrente – pelos mais diversos motivos –, tem determinado outra função e uma imagem desfavorável da própria atividade política. Por outras palavras, além de diversas situações concretas e objetivas, nos últimos anos, quer na RAM quer no país, esta nobre atividade sofreu uma espécie de linchamento mediático que se justifica graças aos inúmeros casos de incompetência, inépcia, agnosia, corrupção e quase toda uma espécie de escândalos por parte de quem desempenha cargos na política. Pessoalmente, convenço-me de que a maioria dos políticos são bem melhores do que o descrédito a que foram votados, mas a considerável avaliação desfavorável quanto à práxis política deve-se, por exemplo, na RAM e em Portugal, a um conjunto alargado de situações, factos, orientações e decisões que não só fizeram diminuir a confiança na missão da política, como afastaram o interesse da maioria dos cidadãos da administração da coisa pública. Por exemplo, são vários os figurinos de alguém que entrou deputado e saiu administrador e/ou consultor de empresas em sectores estratégicos; que entrou secretário de estado (na RAM, diretor ou secretário regional) ou ministro e saiu empresário; que ingressou supervisor e saiu banqueiro ou que se iniciou como banqueiro e saiu supervisor. Poderíamos, inclusive, expressar que a vida de quem exerce cargos políticos – de topo – no setor público é, no mínimo agitada e, diz o ‘cidadão comum’, garantia de futuro promitente.
A juntar a esta crítica, e provavelmente menos abonatório ainda, estão todos aqueles escândalos que nos últimos 43 anos de democracia pluripartidária foram noticiados pelos órgãos de imprensa (e – alguns – julgados nos órgãos judiciais competentes), como foram os casos do ex-governador de Macau, Carlos Melancia, dos ex-secretários de Estado Costa Freire, Silva Peneda, Couto dos Santos, do ex-ministro Braga Macedo, de Paulo Pedroso (ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade), o da Universidade Moderna que envolveu Paulo Portas (na altura ministro da Defesa), os de Isaltino de Morais e Fátima Felgueiras… e, mais recentemente, de Armando Vara, Mário Lino, Paulo Portas (e os famosos submarinos), Duarte Lima, Paulo Penedos, Nobre Guedes, Miguel Relvas, Passos Coelho (e o processo Tecnoforma) e, finalmente, o ex-Primeiro ministro José Sócrates (a operação “Marquês”) e os vistos ‘gold’ e o ex-ministro Miguel Macedo.
Na RAM, “casos” também não faltaram, como, por exemplo, o da dívida pública oculta da Madeira (cerca de 1.113,3 milhões de euros encobertos durante três anos), agora arquivado pela Procuradoria-geral da República e que envolvia o próprio Presidente do Governo Regional, à época, e dois secretários regionais. Mas outros escândalos também constam do panorama político regional, como são os de condenação por corrupção passiva de um deputado regional, de ex-autarcas por prevaricação e corrupção e, mais recentemente, a nomeação de figuras proeminentes da política madeirense na famosa investigação dos ‘Panama Papers’.
Com tudo isto, e reconhecendo que a maior parte das críticas têm razão de ser, a prática política nacional vive hoje um momento de descrédito e de alguma intolerância dos cidadãos face a um enquadramento institucional corrupto e desorientado, contudo é importante aqui recordar algo: ao desqualificarmos a política, aqueles que têm um qualquer poder de outro tipo (por exemplo, económico), aprovam-no com grande entusiasmo. Mais: pior de que uma má política, só mesmo a sua ausência!
Miguel Alexandre Palma Costa
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