Lógica aristotélica ou clássica
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O estudo das condições em que podemos afirmar que um dado raciocínio é correcto, foi desenvolvido por filósofos como Parménides e Platão. Mas foi Aristóteles quem o sistematizou e definiu a lógica como a conhecemos, constituindo-a como uma ciência autónoma. Falar de Lógica durante séculos, era o mesmo que falar da lógica aristotélica. Apesar dos enormes avanços da lógica, sobretudo a partir do século XIX, a matriz aristotélica persiste até aos nossos dias.
Os principais escritos de Aristóteles sobre lógica, foram reunidos pelos seus continuadores após a sua morte, numa obra a que deram o nome de Organon, e que significa “Instrumento da Ciência”.
O Organon está dividido nas seguintes partes:
1. Categorias (escritos sobre a teoria dos tipos, isto é, uma teoria na qual os objectos são classificados de acordo com o que se pode dizer significativamente acerca deles).
2. Tópicos (escritos para orientar todos aqueles que tomam parte em competições públicas de dialéctica ou discussão).
3. Refutações dos Sofistas.
4. Interpretação (escritos sobre os juízos).
5. Primeiros Analíticos (escritos sobre o silogismo em geral).
6. Segundos Analíticos (escritos sobre a demonstração).
Foram múltiplas as contribuições de Aristóteles para a criação e desenvolvimento da lógica como a conhecemos. Entre outras, devem-se-lhe as seguintes contribuições:
1ª- A separação da validade formal do pensamento e do discurso da sua verdade material;
2ª- A identificação dos conceitos básicos da lógica;
3ª- A introdução de letras mudas para denotar os termos;
4ª- A criação de termos fundamentais para analisar a lógica do discurso: “Válido”, “Não Válido”, “Contraditório”, “Universal”, “Particular”.
A lógica de Aristóteles tinha um objectivo eminentemente metodológico. Tratava-se de mostrar o caminho correcto para a investigação, o conhecimento e a demonstração científicas. O método científico que ele preconizava assentava nas seguintes fases:
1.º Observação de fenómenos particulares;
2.º Intuição dos princípios gerais (universais) a que os mesmos obedeciam;
3.º Dedução a partir deles das causas dos fenómenos particulares. Aristóteles estava convencido que se estes princípios gerais fossem adequadamente formulados, e as suas consequências correctamente deduzidas, as explicações só poderiam ser verdadeiras.
Apesar dos enormes avanços que produziu, a lógica aristotélica, tinha enormes limitações que se revelaram mais tarde, verdadeiros obstáculos para o avanço da ciência:
1ª- Assentava no uso da linguagem natural, e portanto, estava muitas vezes enredada nas confusões sobre o sentido das palavras (polissemia).
2ª- Atribuiu uma enorme importância ao estudo dos 256 modos do silogismo e à consideração de enunciados que continham exactamente dois termos. Os seus continuadores, acabaram por reduzir a lógica ao silogismo.
Ainda na antiguidade clássica são de referir os notáveis contributos para a lógica formal devida aos estóicos.
Durante a Idade Média, em especial durante o florescimento da escolástica (séculos XIII a XV), foram realizados notáveis progressos na lógica aristotélica. A lógica tornou-se mais sistemática e progressiva. São de salientar os contributos de Duns Escoto, Guilherme de Occam, Alberto da Saxónia e Raimundo Lúlio.Este último concebeu o projecto de mecanização da lógica dedutiva, ideia mais tarde desenvolvida por Leibniz. É neste período que o português Pedro Hispano escreve a Summulae Logicals, o tratado de lógica mais difundido em toda a Europa até ao século XVI.
A lógica foi durante a Idade Média entendida como a “ciência de todas as ciências”. Competia-lhe validar os actos da razão humana na procura da Verdade. De acordo com o pensamento corrente no tempo, o saber científico tinha que obedecer à lógica formal. A partir de um conjunto de princípios universais admitidos como verdadeiros, por um processo dedutivo procurava-se encontrar a explicação para todos os fenómenos particulares. Embora este método fosse igualmente preconizado por Aristóteles, na Idade Média deu-se uma enorme importância à dedução, desvalorizando-se por completo a indução na descoberta científica. Este facto teve como consequência ter-se cortado com a base empírica da investigação.
A partir do século XVI a lógica aristotélica começa a ser questionada. Os métodos dedutivos que a mesma preconizava para a investigação científica, começam a ser postos em causa, com o emergir da ciência experimental. A partir do particular os cientistas procuram agora atingir o universal, e não o contrário, como preconizava a lógica aristotélica. Rompeu-se assim com os estudos seculares da lógica dedutiva e procurou-se fundamentar as regras do raciocínio indutivo. A lógica formal entra num período de descrédito, devido às críticas de filósofos como Francis Bacon (1561-1626) e R. Descartes (1596-1650).
A principal obra de F. Bacon – Novo Organon – indica desde logo a sua intenção de substituir o organon aristotélico. Tratava-se de criar um novo método de investigação científica – o método indutivo – experimental. A principal contribuição está no facto de ter valorizado o papel da indução. A investigação científica devidamente conduzida era uma ascensão gradual indutiva, desde as correlações de baixo grau de generalidade até às de maior nível de generalidade.
Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) ocupa um lugar especial na história da lógica. Este filósofo procurou aplicar à lógica o modelo de cálculo algébrico da sua época. Esta é concebida como um conjunto de operações dedutivas de natureza mecânica onde são utilizados símbolos técnicos. Era sua intenção submeter a estes cálculos algébricos a totalidade do conhecimento científico. Na sua obra Dissertação da Arte Combinatória, apresenta os princípios desta nova lógica:
1. Criação de uma nova língua, com notação universal e artificial;
2. Fazer o inventário das ideias simples e simbolizá-las de modo a obter um "alfabeto dos pensamentos" simples expressos em caracteres elementares;
3. Produzir ideias compostas combinando estes caracteres elementares;
4. Estabelecer técnicas de raciocínio automatizáveis, de modo a substituir o pensamento e a intuição, por um cálculo de signos.
O raciocínio torna-se, neste projecto de Leibniz, um cálculo susceptível de ser efectuado por uma máquina organizada para o efeito. Esta ideia irá inspirar até aos nossos dias não apenas o desenvolvimento da lógica, mas a criação de máquinas inteligentes.
Ao longo do século XX assistiu-se por um lado à generalização e diversificação dos estudos da lógica matemática (George Boole [1815-1864] é considerado o pai da lógica matemática), atingindo um elevado grau de formalização.
A lógica possui actualmente um sistema completo e complexo de símbolos e regras de combinação de símbolos para obter conclusões válidas. Este facto tornou-a particularmente adaptada a ser aplicada à concepção de máquinas inteligentes.
No século XX, os inventores de máquinas inteligentes tinham então ao seu dispor uma ferramenta fundamental: uma lógica amplamente formalizada. As operações lógicas elementares foram rapidamente aplicadas nas novas máquinas. O primeiro computador totalmente automático, o IBM-Havard Mark 1, só se concretizou em 1944. Dois anos depois, Eckert e Mauchly apresentam o ENIAC, um computador totalmente electrónico. Em 1950, entra em funcionamento o EDVAC, concebido, entre outros, por Von Neumann. Este computador tinha duas características que se tornaram comuns aos futuros computadores: os programas memorizados e o sistema numérico binário (criado pelo matemático e lógico G. Boole).Os primeiros circuitos integrados práticos datam de 1959. Os microprocessadores foram inventados em 1969, no ano em que surgia a Internet. Começava então a revolução dos computadores.
O desenvolvimento dos computadores acabou por impulsionar o aparecimento de uma nova ciência nos anos cinquenta, a inteligência artificial. Esta ciência dedica-se ao estudo da construção de máquinas capazes de simularem actividades mentais, tais como a aprendizagem por experiência, resolução de problemas, tomada de decisões, reconhecimento de formas e compreensão da linguagem. As linhas de investigação são essencialmente três: simulação das funções superiores da inteligência; modelização das funções cerebrais, explorando dados da anatomia, fisiologia ou até da biologia molecular; reprodução da arquitectura neuronal de um cérebro humano, de forma a produzir numa máquina condutas inteligentes.
Miguel Alexandre Palma Costa