Este espaço comunicativo foi pensado com o propósito de facultar a todos os interessados um conjunto de reflexões e recursos didácticos relativos ao ensino das disciplinas de Filosofia e Psicologia, acrescentado com alguns comentários do autor.

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Domingo, 14 de Dezembro de 2014

Retórica "branca" e retórica "negra"

 

Retórica.png

 

«A colocação da interrogatividade em evidência permite compreender uma oposição entre dois usos da retórica: aquele que visa manipular os espíritos e aquele que, pelo contrário, torna públicos os procedimentos da primeira, e de uma maneira mais geral todos os mecanismos da inferência não lógica. Platão agrupava poetas e sofistas no mesmo campo, porque uns e outros se esforçavam por fazer passar por verdadeiros ou verosímeis os discursos desprovidos de verdade: faziam trocadilhos sobre os seus sentidos, apresentando como evidente aquilo que deveria ser problemático. Dai a ideia de ficção, mas também de manipulação pela linguagem, que consegue fazer passar por resposta aquilo que é uma questão. A confusão entre a resposta e a questão é assim a origem desta «retórica negra», como lhe chamava Barthes, uma retórica que se dispõe a tornar concludente, verídico e justo aquilo que na realidade coloca como questão. Para se compreender a essência do pensamento, importa portanto restabelecer sempre a diferença questão-resposta, aquilo a que eu chamei a diferença problematológica. Tendo em conta esta diferença, podemos então distinguir dois tipos de uso retórico: aquele que é crítico e lúcido sobre os procedimentos de discurso, e aquele que visa ofuscar o interlocutor, ou em todo o caso adormecê-lo.

A retórica branca, se tal termo for lícito, não elimina a interrogatividade pelo seu responder, mas exprime antes o problemático sem nunca o ocultar nos seus argumentos e nas suas respostas. Engloba assim simultaneamente o estudo da retórica e o seu uso. Na negociação da distância entre os questionadores, analisa-se a relação questão-resposta porque surge colocada em prática, mesmo implicitamente. Mas a retórica branca debruça-se também sobre a maneira como esta interrogatividade está implicada no responder que se ignora mais ou menos como tal, que é mais ou menos manipulador e ideológico, e que recalca a interrogação para «passar» junto daquele a quem se dirige enquanto discurso.

Sendo assim, todo o discurso é de certa maneira um responder. Nesta qualidade, o discurso retoma e pressupõe sempre um questionamento. É sempre questão de qualquer coisa que se oculta na resposta mas que não se apresenta como tal. Equivale isto a dizer que todo o discurso é manipulador pelo facto desta ocultação, e que é mais ou menos modulado consoante os contextos? Quererá isso dizer que o locutor se esforça sempre por agradar, seduzir, ou até manipular? Sem dúvida que poderíamos encontrar uma tal intenção em todo o uso discursivo. Mas isto não implica qualquer aspecto formal do discurso. Considerá-lo interrogativamente ou, pelo contrário, não se preocupar com esta interrogatividade, é tudo o que separa a retórica branca da retórica negra, o uso crítico da manipulação ou do hermetismo. Em todo o caso, o problema do locutor comanda o seu discurso. É nisso que se diferenciam aliás a argumentação e o estilo, a «retórica dos conflitos» (onde discutimos teses opostas, como num processo) e a «retórica das figuras», que configuram a estrutura da literatura.

Podíamos também opor a argumentação - que trata de questões que dividem os sujeitos - e a retórica, que procede como se elas estivessem resolvidas. Esta seria portanto manipuladora, e a outra racional. É aliás sob este ângulo que especialistas contemporâneos como Toulmin a Perelman se esforçaram por reabilitar a argumentação num quadro renovado da racionalidade. (...)

Deste modo, a fronteira entre retórica branca e retórica negra deve-se apenas à maneira de interrogar: tanto aquela que preside à emissão do discurso como aquela que determina as modalidades da sua recepção. Existe o agradar e o seduzir como vontade e existe o agradar e o seduzir como efeitos. O estudo da retórica «branqueia» o modo de interrogar na medida em que assim nos esforçamos por desmontar os mecanismos do responder, quer este esteja oculto ou não. (...)

No fundo, a diferença entre a retórica branca e a retórica negra deve-se a uma diferença de atitude, mesmo se a dupla possibilidade está inscrita no uso da linguagem. Esta distinção, por clássica que seja, deixa de lado a verdadeira questão de saber por que razão os homens se deixam manipular, por vezes de maneira perfeitamente deliberada e consentida. A mulher sabe que este homem tenta seduzi-la e que aquilo que ele diz reenvia na realidade para um desejo que seria brutal a inaceitável exprimir tal e qual. O espectador sabe igualmente que este ou aquele produto não possui forçosamente as qualidades elogiadas na publicidade e que é apenas a vontade de vender que se exprime. A mesma coisa para o político, aparentemente preocupado com o bem-estar dos seus eleitores. Em resumo, a verdadeira questão não se situa tanto ao nível do ethos, da vontade ou não de seduzir e de manipular, mas do pathos, quer dizer, da aceitação mais ou menos consciente dessa manipulação. (...)

Censurar ao discurso que ele é manipulador equivale na realidade a censurar o discurso por ser. Porque está na natureza da discursividade apresentar-se antes de mais como responder, como respostas, tal como está no poder dos homens decidir querê-lo ou não, aceitá-lo ou não, jogar o jogo ou não, investigar os problemas subjacentes ou não, e finalmente pronunciar-se sobre eles livremente ou fiando-se no que os outros propõem, muitas vezes em função dos seus próprios interesses. Se a retórica é culpada, é-o então do mesmo modo que a medicina ou a ciência em geral. Condenaremos a arte médica por haver médicos que podem utilizar a sua ciência para fazer o mal, como o fizeram nos campos de concentração nazis ou nas prisões argentinas? O mesmo vale para a linguagem: ela serve a verdade, mas não basta para a garantir por si só. Ela pode encobrir a mentira, pode seduzir e convencer, tal como pode manipular e enganar. Se a retórica é útil, isso deve-se ao facto de permitir que os homens exerçam o seu sentido crítico e o seu juízo em plena consciência.

Mas, no fundo, de onde vem o juízo?»

 

MICHEL MEYER, Questões de Retórica: Linguagem, Razão e Sedução, Lisboa, Edições 70, 1993, pp. 46-51.


rotasfilosoficas às 17:11

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Segunda-feira, 1 de Dezembro de 2014

Do concurso de Professores à autonomia das escolas

 

Autonomia.png

 

No passado dia 20 de outubro, o programa Prós e Contras da RTP dedicou mais uma das suas emissões a um debate sobre a escola pública, intitulado “Vida difícil nas escolas”, onde os intervenientes/interlocutores presentes expuseram argumentos sobre o processo – atribulado e pouco claro – de colocação de professores, nas escolas, no início deste ano lectivo, a questão da autonomia das mesmas e as consequências da qualidade (ou falta dela) no/do ensino para os alunos.

Ora, relativamente às posições apresentadas (e também graças a declarações prestadas por uma “jovem” deputada regional do PSD-Madeira num outro programa da RTP-M), gostaria de tecer aqui algumas considerações – talvez um pouco “contracorrente” – mas que julgo que alguns docentes e até ex-docentes compartilham, e que passo a enunciar:

- Primeiro, quanto ao processo de colocação de professores, vulgarmente chamado de concurso anual de professores (desde o “regular” – quadrienal para os docentes dos quadros – ao “extraordinário”, que trata docentes contratados de modo diverso e algo discriminatório dos docentes com contrato resolutivo a termo incerto, ex-quadros de nomeação definitiva) todos sabemos que o mesmo não é “íntegro”, transparente e regido por normas inteiramente constitucionais/legais, como é o caso dos professores das regiões autónomas que se vêm impossibilitados de aceder a determinados campos do concurso (por exemplo, os professores dos QZP das RA) para poderem ingressar numa escola não agrupada ou agrupamento de escola de Portugal continental. Aliás, mesmo contra pareceres jurídicos e alertas dados por organizações sindicais e até a Provedoria de Justiça, o MEC sempre discriminou os docentes das RA que têm o direito constitucional de concorrer em igualdade de circunstância como qualquer professor que tenha provimento no continente.

- Novamente, no programa Prós e Contras foi excessivamente dito e repetido o grave problema dos alunos estarem – e depois de já se ter completado mais de um mês de aulas do calendário escolar deste ano – com professores ainda em falta; de os mesmos estarem a perder as “matérias”; destes não se encontrarem em pé de igualdade com todos os outros alunos que têm todos os professores a leccionar os conteúdos programáticos; e de terem metas curriculares para atingir iguais a quaisquer outros que começaram o ano lectivo com a normalidade devida, na medida em que todos serão alvo de avaliações externas que não diferenciam alunos que começaram a atividade lectiva em setembro ou em novembro. Contudo, e não omitindo a importância das aprendizagens dos alunos, esqueceu-se um pouco o drama/realidade dos professores que dão o melhor de si para que estes possam ter um direito que é legal e moralmente seu, isto é, aprender; professores que ficam colocados a mais de 500 quilómetros de casa, que deixam filhos entregues a familiares ou que se mudam para quartos alugados com os seus próprios filhos privando-os de muitos direitos que também são seus; professores que renunciam aos seus descendentes as “raízes” sociais que são suas e o direito a crescerem numa família biparental; professores e filhos que vivem como nómadas, e ainda por mais na incerteza de um amanhã que mais não tem para lhes oferecer do que o desemprego certo! Sim, a realidade do professor, o respeito pela figura social do professor, a consideração pela missão do professor, a dignidade do professor, isso pouco ou já nada importa!

-Todavia, e não obstante da gravidade da situação, o que verdadeiramente me levou a escrever estas palavras foi a questão da autonomia das escolas. Autonomia é uma palavra “formosa”, mas de que falamos quando evocamos o termo? A que autonomia nos estamos a referir? Que autonomia quer a escola pública? Autonomia para, como disse um dos directores de agrupamento de escola presentes no programa, “poder ficar com um professor para sempre”? Melhor ainda se este professor for membro da sua família, amigo ou referenciado por um qualquer partido político. Neste caso o seu novo emprego tornar-se-á vitalício? Autonomia para selecionar funcionários, serviços e empresas com quem se contratualiza obras ou préstimo de bens/serviços, como por exemplo, o simples aluguer de fotocopiadoras, a venda de produtos alimentares, etc.? Autonomia pedagógica? Autonomia política do MEC? Ou apenas autonomia económico-financeira? Afinal, que tido de autonomia é pretendida? Melhor, será esta “bendita” autonomia mais amiga dos professores e alunos e mais transparente nos seus processos? E será uma autonomia com que contrapartidas? O que dará a escola pública em troca de mais autonomia? Com que se compromete? Melhor qualidade de ensino? Melhores resultados nas avaliações internas e externas? Maior empregabilidade dos alunos no mercado de trabalho? Em poucas palavras, julgo que presentemente nunca a escola pública foi tão autónoma quanto hoje, mesmo com todos os conspectos negativos que lhe possamos apontar.

Neste ponto, gostaria ainda de acrescentar que se a escola pública exige mais autonomia, ela deve dar testemunho de quais as suas reais intenções com tal demanda e inverter (com números reais) a atual situação de uma inexorável falta de “qualidade” crescente do/no ensino em Portugal, e como corroborante de tal facto menos abonatório da educação nacional são os números dos últimos anos que bem o comprovam. Ora, vejamos:

- Sabemos hoje que o financiamento com despesas da educação baixou para níveis de à 10 anos atrás. Por exemplo, em 2013 o estado gastou cerca de 7.108.4 milhões de euros em educação, número muito idêntico ao gasto 10 anos antes, isto é, 2003, ano em que foram gastos 7.005.0 milhões de euros, o que atesta só por si já um significativo decréscimo de investimento no sector. Mas também os resultados dos alunos têm piorado ano após ano em diversos parâmetros, e a situação dos professores não é em nada melhor. Vislumbremos então alguns dados: o número de docentes em exercício nos ensinos pré-escolar, básico e secundário, em 2013, era de 150.311, número só idêntico a 1994, em que era de 151.219 professores, e em 1993, de 149.474. Relativamente aos resultados escolares, também aqui a qualidade não tem atingido o desígnio a que se reserva. Por exemplo, a percentagem do número de alunos com nota positiva nas provas de exame do ensino básico do terceiro ciclo, a Português, é hoje (2014) de 70,9%, muito inferior à percentagem registada em 2008, que era de 84,9%. Praticamente o mesmo ocorre na disciplina de Matemática, onde a percentagem do número de alunos com nota positiva nas provas de exame do ensino básico do terceiro ciclo é, em 2014, de 55,4%, quando em 2009 foi bem superior, o número exacto é 66,0%. Já no ensino secundário, em 2014, à disciplina de Matemática A, os resultados obtidos também foram muito inferiores a 2008, ou seja, passamos de 85,3% de positivas para quase metade, isto é, 44,8% no ano que agora finda, 2014. Já a Português, no secundário, a descida é mais suave, isto é, em 2009, 80,1% dos alunos obtiveram nota positiva no exame, sendo que este ano (2014) somente 77,4%.

Outro número bastante interessante é aquele que se reporta ao número total de alunos matriculados e, em 2013, estavam nesta condição 2.139.977 indivíduos, número muito comparável com 2006, em que eram 2.121.260 indivíduos, mas já bastante inferior ao ano de 1992, onde o total perfazia cerca de 2.305.584 indivíduos. E se também observarmos o número de alunos matriculados pela primeira vez no ensino superior em Portugal, verificamos que em 2008 era de 114.114 indivíduos, mas em 2013 esse número ficava já somente pelos 106.249, menos cerca de 10.000 alunos que no ano anterior (2012).

Ora, face a tudo isto, podemos dizer que é a autonomia das escolas que resolverá o problema de fundo da escola pública? Obviamente, não! O problema é muito mais abrangente, e se é verdade que o diagnóstico está feito e é do domínio público há já bastante tempo, assim como são sobejamente conhecidas as medidas necessárias para alterar toda esta grave situação, digo que ela só será transformável a partir do momento em que se pensar ouvir na verdadeira acepção da palavra os professores - e mesmo os professores e não somente as suas estruturas sindicais com as quais muitos já não se revém - , alunos, pais/encarregados de educação, autarquias e, mais importante que tudo, quando existir uma verdadeira vontade política na 5 de Outubro de dar à escola pública aquilo que ela merece desde à muito, isto é, liberdade de acção e responsabilização efectiva dos seus diversos elementos/representantes pelo trabalho desenvolvido, permeando o mérito de quem efectivamente o tem.

 

Miguel Alexandre Palma Costa 


rotasfilosoficas às 21:27

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