Este espaço comunicativo foi pensado com o propósito de facultar a todos os interessados um conjunto de reflexões e recursos didácticos relativos ao ensino das disciplinas de Filosofia e Psicologia, acrescentado com alguns comentários do autor.

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Segunda-feira, 31 de Agosto de 2020

Prometer ilusões

 

 

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Nas palavras do atual Primeiro-ministro, cumprir as promessas “é essencial para recuperar a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas e (…), para que os cidadãos voltem a acreditar que vale a pena votar porque com o voto decidem e com o voto mudam aquilo que é necessário mudar.(…) É assim que nós sabemos estar na política, é assumindo compromissos com os cidadãos e honrando os compromissos com os cidadãos”(20 de maio de 2017).

 

Declarações idênticas a estas, enunciadas repetidas vezes por diferentes atores políticos, sejam em período de campanha eleitoral ou não, mostram que a essência da política é a promessa, e uma promessa é um valor (mas também dívida contraída) a realizar no tempo e “todas as sociedades procuram aplicar esse ideal ao facto da existência” (Mendo Henriques).

 

O elementar estudo de uma área como a Ciência Política – e mesmo a leitura de alguns artigos de politólogos difundidos na imprensa nacional –, evidencia que em média os governos das últimas duas décadas cumpriram somente 50% das promessas eleitorais, tendo parcialmente cumprido outros 10%, ou seja, remanescem perto de 40% que ficaram por cumprir. Tal facto significa, para o comum dos cidadãos, que quem já ocupa a cadeira do poder (ou a ambiciona), promete excessivamente, mas depois dispensa pouco tempo a cumprir o que assumiu ou simplesmente 'esquece' muitas das promessas proferidas. Mas o que é uma promessa? É não só uma declaração em que um sujeito anuncia a outrem (ou a si mesmo) uma ação futura ou intenção de dar, fazer ou dizer algo, mas também, e particularmente, um acordo/contrato, sem subordinação a tipos legais nem a formalismos, além dos necessários para a prova, em que as partes se obrigam a cumprir um determinado compromisso instituído. No domínio religioso – e o termo ‘promessa’ tem raízes em ideias religiosas (o nome hebraico de shalom simboliza o ideal de justiça e paz, mas também salaam, ‘salvação’) – está associado ao voto, isto é, a uma oferta ou obrigação, deliberada e livre, a que um indivíduo se compromete perante Deus ou um santo, para obtenção da sua intercessão ou graça.

 

Recordo que a Igreja, no passado, também aplicou a promessa como remissão da culpa futura (que ia para além da remissão do castigo temporal), através da prática da venda de indulgências (penas pecuniárias). Em termos populares – e o povo não compreendeu bem estas expiações supérfluas dos pecados –, eram a promessa de “um bilhete para o céu”, ao qual a Igreja não deu uma conveniente explicação, e que veio a culminar na afixação das 95 teses Acerca do Poder e Eficácia das Indulgências, em 1517, por Martinho Lutero. Pelo acima exposto, é fácil de perceber que as promessas em política têm muito em comum com as algumas ideias dos primórdios da religião: a prosperidade, libertação, justiça, o bem comum, a vida boa e até a terra prometida. Porém, hoje os políticos vão mais além. Diariamente escutamos ‘juras’ de um mundo melhor, de ganhos e vitórias em toda a linha, de oportunidades únicas que não podemos (nem vamos) perder, de sucessos, metas e proveitos alcançados, conquistas realizadas, mas – e não raras as vezes – a realidade com a qual nos defrontamos todos os dias, fácil e rapidamente ‘desmonta’ a propaganda política (e pantominices) de quem a faz (e partilha), para além dos riscos que representam para a própria democracia que agora está ameaçada por modernos populismos de extrema direita que encolerizam a Europa e as Américas. A este propósito, John Keane, alerta-nos justamente para os “novos inimigos da democracia” e para a sua diferida, mas progressiva ‘desintegração’.

 

Atualmente, as promessas e esperanças políticas profetizadas aos cidadãos são inúmeras e de natureza variada. Vão desde o defender/salvar o SNS – a joia da coroa do PS; investir na Educação e combater o insucesso e abandono escolar; modernizar, qualificar e diversificar o Ensino Superior; responder e reagir ao desafio do “inverno” demográfico; desenvolver uma nova geração de políticas de habitação; valorizar o território nacional, impulsionar o desenvolvimento rural e combater a desertificação do interior (há anos, completamente abandonado pelas políticas públicas); apostar na economia do Mar, um investimento que para o nosso país é considerado a ‘porta do futuro’; promover a coesão territorial e a sustentabilidade ambiental (reduzir em 50% das emissões de dióxido de carbono até 2030, produzir 80% da energia elétrica com fontes renováveis e eliminar os plásticos não reutilizáveis até ao final de 2020, mas conjuntamente “ir além do acordo de Paris”); implementar uma rede ferroviária de alta velocidade que ligue Lisboa e o Porto ao centro da Europa; valorizar a atividade agrícola e florestal e o espaço rural; avançar na coesão social e contrariar as desigualdades; assegurar a sustentabilidade da Segurança Social; combater a pobreza e dar uma resposta a cada sem-abrigo que vive na rua; construir uma sociedade mais ‘igual’ e justa; criar uma agenda própria que combata eficiente e eficazmente a corrupção; diligenciar mais investimento na qualidade dos serviços públicos; baixar os impostos, em particular o IRS para a classe média; realizar mais investimento em Defesa e novos “incentivos financeiros” e de outra natureza, para recrutar e reter talentos nas Forças Armadas; reduzir a dívida pública para menos de 100% do PIB; recrutar mais 10 mil elementos para os serviços e forças de segurança; valorizar o salário mínimo, isto é, atingir um salário mínimo de 750 euros em 2023; mas também compromissos como a construção de um nova ponte sobre o rio Tejo, entre o Barreiro e Lisboa, e a sempre eterna promessa de nominal e real convergência do país com a União Europeia. Na Região Autónoma da Madeira, escutámos, por exemplo, que se iria construir um teleférico e um centro de interpretação ambiental em plena floresta Laurissilva – declarada património da Humanidade, em 1999, pela UNESCO –; que o Funchal teria uma nova pista de atletismo; que se iria colocar alcatrão também dentro da floresta Laurissilva, com a construção da estrada entre as Ginjas e os Estanquinhos, no Paul da Serra; e que se um determinado candidato fosse reeleito se iria proceder ao prolongamento da Pontinha, um “aumento em cerca de 400 metros, com um custo estimado de 100 milhões de euros”); a construção de um novo Hospital público (duas décadas depois de ter sido idealizado, orçamentado em 352 milhões de euros e para já sem opositores no concurso entretanto aberto)…, ou seja, mais avultadas (megalómanas e algumas inúteis) obras públicas que constrangerão o erário público em vários milhões de euros.

 

Neste rol incompleto de promessas políticas, há boas e más, honestas e inautênticas, sólidas e falaciosas, pois é “tão fácil o prometer” e bem mais difícil o cumprir/concretizar. Para o hábil político, o imprescindível e útil é gerar (e alentar) o desejo no cidadão-eleitor, mesmo que para isso se tenha de prometer (hipocritamente) ilusões ou utopias de um mundo preferível/diferente que nos permita o escape/fuga aos desgostos da vida real. As ilusões na política são fecundas, seduzem o eleitorado, dão-lhe esperança, apesar desta ser pouco saciada e muitas vezes acabar em completa desilusão. Talvez este fenómeno elucide porque a política é hoje uma atividade pouco recomendável aos olhos dos cidadãos, e em 46 anos de democracia a abstenção não ter parado de subir, salvo três ligeiras exceções. Sobeja, então, a questão: na política a “palavra dada ainda é palavra honrada"?

 

 

Miguel Alexandre Palma Costa

(Artigo publicado no jornal online Observador , 28.07.2020)


rotasfilosoficas às 16:36

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