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Domingo, 26 de Abril de 2020

25 de Abril, memória(s) e futuro

 

 

25 de Abril de 1974 - PC.jpg

 

Em 1976, Portugal tinha uma população residente de pouco mais de 9 milhões e 350 mil cidadãos e, nesse ano, nasceram 186 712 nados-vivos, sendo eu um entre tantos. Em 2019, ou seja, no ano transato, este número situou-se em apenas 86.557, menos cerca de 100 mil). No mesmo ano, a idade média das mães ao nascimento do primeiro filho era de 23,7 anos, a taxa bruta de natalidade fixara-se nos 19,8%, a taxa de mortalidade de crianças com menos de um ano de idade por cada 1 000 nascimentos era de 33,4% e a população residente analfabeta com 10 e mais anos era de quase um milhão e oitocentos mil portugueses, ou seja, 25,7% (década de 70, de acordo com os Censos).

 

Estes são números reveladores de um país que pouco mais de 2 anos antes tinha derrubado a mais velha ditadura da Europa, que tinha pronunciado o fim do mais antigo império colonial europeu, que tinha trazido para primeiro plano um “híbrido e muito curioso” grupo de jovens oficiais das Forças Armadas, profundamente influenciados pela teoria e prática das lutas nacionais de libertação fora da Europa e que se viram a si mesmos como uma vanguarda revolucionária (Kenneth Maxwell). Esta geração de “rapazes dos tanques” (onde se destaca, por razões conhecidas, o capitão Salgueiro Maia) que pôs termo ao regime político existente antes do 25 de abril de 1974 – e que fez a transição para a democracia em Portugal – é agora apelidada de geração “Baby Boomer” (1946-1964), termo que deve a designação à “explosão demográfica” que se verificou nos Estados Unidos, no final da 2ª Guerra Mundial. Foi a primeira geração a crescer com a televisão como órgão de comunicação de massas; que ‘conviveu’ com a Guerra Fria; que acompanhou a missão Apolo 11 e assistiu à alunagem – e ao descer das escadas do módulo lunar – e escutou as célebres palavras de Neil Armstrong; que sofreu o choque petrolífero de 1973; que concebeu o movimento hippie e esteve/assistiu ao Woodstock, mas também que muito contribuiu para o desenvolvimento do consumismo (e seus inseparáveis efeitos), suporte do atual modelo económico global, para além de serem idealistas; e que ainda, em alguns casos, exercem o poder nas suas mais variadas formas, mas a maioria está a chegar à idade da reforma.

 

Em Portugal, esta geração viu a oportunidade – e aproveitou-a – para a criação de um novo regime democrático (inserido na 3ª vaga) num país que estava atrasado, estagnado, envolto numa guerra e que definhava económica e socialmente. Não interessa aqui, até porque não dispomos de espaço suficiente, discutir e caracterizar o regime político que vigorou entre 1926 e 1974, mas, e para já, evidenciar algumas das causas que originaram essa 3ª vaga de democratização (causas económicas, políticas, mas também sociais, morais e religiosas) e, que no caso português, destacamos: 1ª- a crise de legitimação dos regimes autoritários; 2ª- o novo papel da Igreja Católica no pós Concílio Vaticano II; 3ª- o impacto da Comunidade Europeia sobre os regimes autoritários ainda existentes na Europa do Sul. Contudo, não poderíamos deixar de lado (e ocultar) factos históricos importantes como a debilidade económica do país, a carência económica e social de muitas famílias, o descontentamento do sector industrial, um sistema bancário retrógrado, a crise que se vivia no sector rural e o êxodo dos campos para as cidades e a emigração, a escassez de produtos alimentares, as perseguições, tortura e prisões arbitrárias promovidas pela PIDE/DGS, a censura, uma elevada inflação, a crise do petróleo entre 1973 e 1974 e a Guerra Colonial ou de Ultramar (1961-1975), que ocupava ¼ dos jovens do sexo masculino com o cumprimento do serviço militar durante 4 ou 6 anos, e que também exigia elevados custos financeiros, para além de ‘sorver’ entre 7 a 10% da população portuguesa e mais de 90% da juventude masculina. Ainda em termos de perdas de vidas humanas, durante os treze anos da Guerra Colonial, morrem mais de 8 mil cidadãos portugueses e ficariam feridos ou incapacitados cerca de 100 mil (Irene Pimentel), dos quais cerca 3 mil ficaram sepultados na terra onde foram chamados a combater.

 

Incompleta, sem dúvida esta narrativa do que se passou naqueles longos 48 anos e na noite que antecedeu a revolução do 25 de Abril, à famosa pergunta: “Ouve lá, onde é que você estava no 25 de Abril?” – da autoria do jornalista e escritor Armando Baptista-Bastos (“Conversas Secretas”, SIC), mais tarde imortalizada por Herman José, no programa televisivo da RTP 1, “Herman Enciclopédia” – , a reposta que eu e toda geração Z (os que nasceram entre 1997 e 2012) proferiríamos era de que “não, não estivemos lá…”, o 25 de Abril não foi uma experiência para nós, mas é uma “memória contada”, aquela que vivi(emos) na pele dos nossos pais ou avós (mais de metade da população atual do país não era nascida quando se deu o restabelecimento da liberdade e democracia), mas também de todos os outros que nos falaram dela e presenciaram o momento histórico da viragem de um país.

 

Como bem escreve Fernando Pessoa, agora “vivemos da memória, que é imaginação do que passou”, mas também esperança e confiança num sonho que não pode não existir. Creio que a minha primeira e mais remota memória de Abril está diretamente ligada, precisamente, ao porta-voz dessa esperança, José Afonso (Zeca) – autor e intérprete de “Grândola Vila Morena”, canção escolhida como senha pelo MFA para dar o sinal confirmativo de que as operações militares estavam em marcha e eram irreversíveis –, possuidor de uma voz e timbre únicos, segundo tenor em várias comitivas do Orfeão Académico de Coimbra e da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, estudante do curso de Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras de Coimbra e mais tarde, em 1953, incorporado na Escola Prática de Infantaria (Mafra), tal como eu.

 

Ora, considerando que é de extrema relevância saber e compreender o legado (e perspetiva) do 25 de Abril nas novas gerações, deliberei auscultar 25 jovens alunos, do 12º ano, sobre esta temática, e solicitei, a cada um deles, uma reflexão pessoal onde expusessem a visão da geração Z a respeito do acontecimento histórico que foi o 25 de Abril, que significado representa, mas também qual o grau de conhecimento sobre os antecedentes, causas e principais consequências da revolução/golpe militar do 25 de Abril e, por último, a evolução democrática, no nosso país, nos últimos 46 anos. Algumas das ideias e apreciações apontadas por estes alunos transcrevo-as, em seguida, para ser o mais preciso para com os testemunhos:

 

- “Relativamente à menor valorização dos Capitães de Abril pela Geração Z do que pelas gerações anteriores, o principal fator para tal é a consciencialização dos vários atos, também eles antidemocráticos e contra o primado da pessoa humana, ocorridos durante o PREC. Quanto muito, pode ser dito que os jovens idolatram alguns líderes partidários da Assembleia Constituinte, tais como: Mário Soares, Francisco Sá Carneiro, Álvaro Cunhal e Diogo Freitas do Amaral. Isto porque estas figuras são vistas como os verdadeiros fundadores da democracia portuguesa. (…) Por fim (…), existem jovens que não estão informados sobre o assunto, apesar de ser parte do seu currículo escolar, e não possuem o mínimo interesse em estar. Isto é agravado pelo desinteresse sobre História entre a Geração Z, impulsionado pelas constantes e rápidas alterações da realidade atual, nomeadamente na tecnologia, cuja influência é incomensurável. (…) Em suma, existe um quase total desconhecimento sobre o desenvolvimento da revolução na RAM e, a nível nacional, os jovens valorizam significativamente o 25 de abril, não por ter terminado a ditadura, mas sim por ter implementado o Estado de Direito Democrático. Essa alteração é vista, também, como um progresso importante para a modernização da sociedade. Isto porque, nos dias que vivemos, os Estados sob regimes não democráticos são unanimemente considerados atrasados e subdesenvolvidas. Desta forma, a Geração Z olha para a democracia como a norma e não como algo que foi conquistado.”

- “Efetivamente, as gerações pós-25 de abril são manifestamente gratas aos capitães de abril. A nossa geração não é exceção, mesmo que o saudosismo não seja a nossa marca, reconhecemos o valor histórico, social e político do nascimento da Democracia em Portugal. A revolução de 25 de abril de 1974 é, portanto, um feito que devemos agradecer aos nossos antepassados, mas não nos podemos resignar, porque o processo está em curso. (…) Nós somos a primeira geração, agora jovem, que não conhece o mundo sem a presença de computadores, tablets e smartphones. Também, somos os jovens que cresceram num mundo pós 11 de setembro, pós ‘derrocada’ dos mercados financeiros, pós o cair por terra de toda a segurança e invulnerabilidade anteriormente adquirida e vivida. E, como tal, só sabemos o que é viver com inseguranças e vulnerabilidades. Por outro lado, o Estado de direito democrático é para a nossa geração um modo de vida. É tão real quanto a insegurança e a vulnerabilidade que nos acompanham, desde sempre. Mas, o trabalho está inacabado. Acreditamos que a democracia está ainda em fase de crescimento e existem mudanças que desejamos ver acontecer.”

- “Para mim, o 25 de abril de 1974 representa a ritualização de uma data, o que lhe retira vigor, esbatendo-lhe os contornos mais vincados, banalizando-a, transformando-a numa imagem perfeitamente convencional. A fragilidade dos ritos democráticos, através da cerimónia pública, significa paradoxalmente, a força da democracia política, mas não substitui o papel do ensino ou da história imediata na transmissão e na reflexão crítica acerca do passado recente. Continua a faltar (…) os elementos indispensáveis à formação de uma “consciência plena do 25 de abril”, o conhecimento lúcido de um período fundamental da história recente do meu país. A atual geração, na qual me incluo, deseja, na sua generalidade, mais do que comemorar o que desconhece, compreender o que foram o Estado Novo e o 25 de abril. Na realidade, a geração que fez o 25 de abril era filha do outro regime. Era filha da ditadura, da falta de liberdade, da pobre e permanente austeridade, enquanto a minha geração atual nasceu logo num mundo de liberdade desmedida, decorrente da liberdade que nos foi oferecida, ao invés da anterior geração que teve de conquistar a liberdade e que por isso lhe dá outro valor.”

 

Hoje, com mais ou menos familiaridade dos acontecimentos desencadeados em Portugal pelo 25 de Abril – “algo especial e único que aconteceu então entre nós (José Medeiros Ferreira) – , abono que é seguro afirmarmos que as mais jovens gerações estão cientes do que foi conquistado, do quanto o país se transformou e avançou nos últimos 46 anos, que não foi fácil todo o caminho realizado (como a própria conquista da liberdade e da democracia), e que o futuro não pode passar pela renúncia ao que foi já alcançado. A atualidade é agora “de grande incerteza” quando ao futuro, sem dúvida, mas todos sabemos de onde vimos, das dificuldades e desafios que temos pela frente e, sobretudo, que não tencionamos regressar a um passado recente onde a liberdade não era tida como um direito absoluto!

 

(Reconhecimento: As limitações e eventuais lapsos que este texto possa ter são da minha inteira responsabilidade, mas a sua escrita muito deve a 25 alunos que não poderia deixar de nomear. Obrigado a António Marques, Catarina Jardim, Francisco Patrício, Gonçalo Silva, Guilherme Sousa, Guilherme Alves, João Freitas, Jorge Lourenço, Júlio Rodrigues, Kamila Skierska, Laura Nascimento, Luís Carapinha, Margarida Figueira, Maria Gonçalves, Maria Abreu, Maria Sousa, Martim Andrade, Martim Pereira, Pedro Rodriguez, Sara Jardim, Sara Sousa, Sara Câmara, Tatiana Rodrigues, Verónica Silva, Vsevolod Tsvetkov e João Almeida.)

 

Miguel Alexandre Palma Costa

(Texto públicado no Diário de Notícias da Madeira, 25.04.2020

in https://files.dnoticias.pt/…/4da9b0bf14dbe662…/13/index.html)

 

 


rotasfilosoficas às 12:10

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