1. O verão de 2024 fica para a história coletiva (nacional) como o período em que mais uma vez ocorrerem fatídicos acidentes e incêndios – destaco aqui aquele que deflagrou, no dia 14 de agosto, nas serras do município da Ribeira Brava, propagando-se depois aos concelhos de Câmara de Lobos, Ponta do Sol e Santana, o qual durou 13 longos (e angustiantes) dias e resultou na destruição de 5.104,1 hectares (segundo dados do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais - Copernicus), mais de 7%, do território da ilha da Madeira, sendo parte significativa em zona do Parque Natural e também de Laurissilva –, mas foi também e durante 16/17 dias, o período em que decorreu mais uma fenomenal edição (a 32.ª) dos Jogos Olímpicos da era moderna (Jogos de Verão), pela terceira vez na cidade de Paris, depois de 1900 e de 1924.
A cerimónia/espetáculo que marcou o arranque oficial destas Olimpíadas aconteceu no dia 26 de julho, pelas 18h30, teve a duração aproximada de quatro horas e contou com a presença de 10.500 atletas de 206 delegações (para cerca de 130 modalidades), que desfilaram em embarcações pelo rio Sena, num trajeto de seis quilómetros a que se adicionaram, nas suas margens, mais de 300 mil cidadãos/espectadores que não quiseram perder esta oportunidade única de assistir presencialmente (“ao vivo”) ao início do maior evento desportivo do mundo (para além dos mais de 3 mil milhões que assistiram pela televisão ou internet). Como é evidente, não poderia aqui esquecer, e debaixo de uma chuva copiosa, as atuações musicais de Lady Gaga, Aya Nakamura, da mezzo-soprano francesa, Axelle Saint-Cirel, que cantou “La Marseillaisee” no topo do Grand Palais e da fenomenal ‘Diva’ Céline Dion, que após uma pausa forçada de 2 anos regressou aos palcos e encerrou a cerimónia com a música “L’hymne à l’amour”, de Édith Piaf.
2. A prática desportiva contemporânea – e em especial o espírito Olímpico – ostenta(m) valores (ou princípios) de nobre relevância que deveriam influenciar (e responder a) outras áreas/sectores das nossas sociedades/nações. Por exemplo, a atividade político-partidária, a economia, o setor empresarial, bancário/financeiro…, e assim contribuiriam para a identificação e resolução de muitos dos problemas vigentes, não esquecendo a existência/promoção de um debate público ininterrupto em torno destes, algo elementar em democracia. Refiro-me, por exemplo, a valores desportivos (e Olímpicos) como o da superação, dedicação/determinação, do trabalho e competição, amizade e solidariedade, respeito, a procura da excelência, a coragem, igualdade, inspiração, mas também a inovação e a tão imprescindível concórdia ou paz. Reavivo, nestas curtas linhas, que é a não indiferença do homem perante factos, situações, objetos e desafios/provas que permite que algo mágico, inexplicável, extraordinário (e até novo) possa ser gerado/concebido, desde os fiascos retumbantes a feitos/êxitos heroicos e históricos que os cidadãos atuais (e vindouros) narrarão às novas e futuras gerações. Também aqui, os valores, como refere o ensaísta e filósofo Ortega y Gasset, são a nossa faculdade de estimar e apreciar (dar um significado especial…) e “estimar é uma função psíquica real – como o ver, o entender” que faz parte da natureza/realidade humana que é preciso aplicar e conservar.
Ora, nas palavras do 25.º presidente francês (o mais jovem da história), Emmanuel Macron, “os jogos Olímpicos e Paralímpicos promovem valores universais. Partilhar alegria, partilhar entusiasmo e partilhar aquilo que parecia impossível há alguns dias ou semanas”, são algo que só este excecional evento desportivo global proporciona! É preciso ainda aqui evidenciar que parte das delegações que estiveram a competir nesta 32.º edição dos Jogos Olímpicos, fizeram-no mesmo havendo tensões entre os seus países e este facto demonstra, por si só, a transcendência do (verdadeiro) desporto.
3. Enquanto sistema de governo e modelo de organização social e política, a democracia precisa de cidadãos com valores, (bons) preceitos, orientações, preferências, ideais… e também de discursos diversos (e mesmo antagónicos), e é desta diversidade/variedade – e até conflitualidade (assente em normas explícitas) – que se alimenta e vive a própria liberdade de opinião (e consequente pluralismo político), ou seja, o sistema representativo liberal vigente em que o povo exerce a soberania através de eleições livres, pelo voto secreto. Infelizmente, há quem por vezes (ou sistematicamente) não respeite as regras democráticas. Chamar a um qualquer cidadão, a um líder do(s) partido(s) da oposição ou a outros agentes políticos “anormais, incompetentes e canalhas” e dizer que “não têm lugar nesta terra” – seja para desaprovar ou criticar ideias/propostas políticas diferentes e/ou qualificar os adversários –, é manifestamente sinal de indelicadeza e desrespeitar os valores democráticos, algo que não deveria (nem pode) acontecer.
Mais: a respeito dos grandes incêndios de agosto último, afirmar/perguntar “o que é que ele (Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa) vem fazer?”, e logo em seguida dar a resposta que o Chefe de Estado “não tem nada para ver” na ilha, e que é “só mato queimado”, parece-me que para além da deselegância, pouca ou nenhuma cortesia e falta de “civilidade” (como alguém já referiu…), declarações destas ajudam a destabilizar/esvaziar o regime democrático, fomentam e/ou inflamam conflitos que só descredibilizam as instituições democráticas, mostram que o discurso político (e público) é cada vez mais “oco” e que já não inspira os cidadãos, para além de estimularem o crescimento – através das notícias que são largamente veiculas pelas televisões (e agora ainda mais nas redes sociais) – de movimentos políticos radicais de extrema-direita e ultra-conservadores (anti-sistema), que adquirirem a olhos vistos maior força em Portugal e na Europa.
Em suma, a crise da democracia também é o efeito da instabilidade (ou pré-colapso) dos seus valores. Liberdade, responsabilidade, igualdade, solidariedade, justiça, equidade, paz, cooperação, sustentabilidade, respeito, confiança, tolerância, inclusão, participação, coesão, transparência e Verdade, são valores indispensáveis num Estado de Direito e no/para o exercício pleno de uma cidadania democrática que está associada a direitos e deveres que todos devem (têm de) cumprir. Num regime democrático liberal multipartidário que acaba de celebrar meio século de Liberdade, os valores democráticos devem ser ativamente cultivados por todos cidadãos, mas principalmente pelos agentes/atores políticos eleitos ou não eleitos! A democracia (e também a atividade política) não pode desligar-se, pior, ser indiferente ao universo ético.
Miguel Alexandre Palma Costa
(Texto publicado no Diário de Notícias da Madeira, in https://www.dnoticias.pt/2024/9/17/420055-os-valores-democraticos/)
1. O sistema democrático, depois de séculos de experimentação de outras (e “desastrosas”) formas de organização política, é aquele que melhor permite o controlo do poder e dos seus excessos, mas também definir com rigor e precaução o papel (e estatuto) do governante, dos partidos políticos, das instituições, … dos cidadãos livres (e participantes) na gestão da res publica (coisa pública, o Estado e sua administração) e das relações existentes entre eleitos e eleitores. A relação de poder – assente na confiança recíproca, na busca do ‘Bem Comum’ e numa colaboração que se deseja benéfica para todos – é a essência da democracia, sistema político que permite em qualquer altura uma variação (alternância) nas posições ou cargos ocupados e o acesso de todos os cidadãos ao poder, isto na medida em que as democracias aumentam (ou devem ampliar) o poder, os direitos e liberdade(s) de cada cidadão.
2. O Poder não deve ser entendido como algo objetivo que alguns (os eleitos) possuem e outros (nós, os eleitores) não, mas sim como algo que emerge no contexto de uma relação interdependência entre os cidadãos, na medida em que alguém tem o controlo sobre o acesso a recursos (e sua distribuição) que são valorizados por todos, conseguindo assim influenciar as suas ações e vidas. São as opções (políticas) de uns que determinam o tipo e a qualidade de vida de muitos outros, e para que o Bem de todos seja alcançado é importante manter-se aquilo a que muitos chamam uma base de interesses comuns.
Em Portugal, e particularmente no arquipélago da Madeira, os últimos governos eleitos têm conseguido segurar o poder (político), mas não têm sabido gerir eficiente e eficazmente os recursos materiais, económicos, financeiros e humanos disponíveis na atual (e difícil) conjuntura, e parecem, aos olhos de uma larga maioria de eleitores que agora vota noutras forças partidárias mais radicais, ter interesses discordantes dos madeirenses e porto-santenses (talvez, dizem uns quantos cidadãos, os seus proveitos pessoais e a preservação no poder).
A liderança política dos últimos anos tem sido pouco competente, nada entusiasmante e bastante limitada na capacidade de agir/intervir no sentido de fazer prosperar, de modo significativo, a vida das famílias madeirenses e porto-santenses, para não mencionar o facto de que quem exerce a máxima autoridade política executiva está neste momento profundamente diminuído do ponto de vista ético e mediático uma vez que é indiciado de vários crimes, assim como três dos seus atuais Secretários Regionais envolvidos na investigação judicial "AB INITIO".
3. O exercício do poder (quase hegemónico) por parte de uma só força política durante mais de 48 anos deixou marcas na vida coletiva madeirense, mas também nas atuais lideranças. Entre 1976 e 2015, o PSD-Madeira ganhou (e governou) com maioria absoluta 11 atos eleitorais, e foram justamente aquelas que se realizaram no dia 29 de março de 2015 as únicas (e últimas) que o atual (e ainda) líder do partido venceu com uma maioria de 24 de deputados eleitos. Nesse ano foi também singular a excelente votação do CDS-PP, superior à obtida pela coligação “Mudança”, formada pelo PS-PTP-PAN-MPT, que uns quantos teoricamente julgavam ser uma alternativa credível. Ora, o povo já não se deixa enganar facilmente e não vota “em rebanho”, isto é, os votos já não são decididos por terceiros, apesar da feira e do animado “leilão de promessas”, na altura da campanha eleitoral, ainda conseguir enganar os mais distraídos. A utilização de todos recursos possíveis e imaginários por parte dos grandes partidos políticos visa exclusivamente a conquista e posterior exercício do poder. Resolver efetivamente os problemas dos cidadãos é uma questão de menor importância.
4. O desgaste, alguma debilidade e já notória falta de energia/motivação do atual líder do Governo Regional (não esquecendo também uma certa dose de “arrogância política, excessos e vaidade”) – que mais não tem sido ultimamente do que um “gestor de crises/casos/escândalos”, em vez de implementar reformas essenciais e estruturais para o futuro dos madeirenses e porto-santenses –, mostram que 9 anos no comando de um partido político e de uma Região deixam marcas profundas no timoneiro, mas também numa terra que vê o seu futuro (e sobretudo da sua população mais jovem) comprometido. Um timoneiro cansado, moído, desorientado, com “síndrome de Hybris” e desafortunado com o que o percurso lhe tem reservado nos últimos anos, tem feito com que a nau ande agora à deriva e parece já não ter a capacidade requerida para encontrar um rumo certo para a Região.
5. O exercício de uma qualquer atividade política (ou cargo público eletivo) restringe-se, ou melhor, digo eu, deveria limitar-se, num (ou em alguns) momentos de natureza temporária em que alguém decide dar o seu contributo – e o melhor de si – à causa pública. Ser Presidente, Ministro, Secretário de Estado, Presidente de Câmara, Deputado… não é nem deve ser uma profissão. Não se “é” ministro ou deputado; “está-se” temporariamente na condição de ministro e/ou de deputado. Bem sei que há quem se mantenha no exercício destas funções por várias décadas – não prezo particularmente o termo “carreira política” –, mas não comparticipo nem dessa intenção nem desse entendimento. A política até pode ser uma vocação, mas não deve ser uma profissão e a consequência disto e de outros fatores negativos, nos últimos tempos, tem sido o afastamento cada vez maior da atividade política ativa dos políticos “com profissão”, pessoas altamente competentes em diferentes áreas/sectores da sociedade que se demonstram cada vez menos disponíveis para trilharem o percurso desta arte e atividade, mesmo que seja por um curto espaço de tempo.
6. Quase meio século de uma ditadura onde foi dominante a perspetiva concentracionária do poder – modelo implementado em Portugal por António de Oliveira Salazar –, onde a sua essência era procurar manter, “conservar”, assegurá-lo através de todos os meios que o Estado punha ao dispor do líder, deixou, seguramente, sintomas e padrões de comportamento em muitas gerações de portugueses. Se em Portugal os mais novos não sabem o que é viver sem liberdade e muito menos o que tolerar é um regime político que os oprime, gerações mais avançadas na idade parecem ter colocado impedimentos/limitações ao uso desta mesma liberdade porque viveram sem ela (com censura e com uma polícia com funções de vigilância político-social) durante quase 50 anos. Não dão opinião sobre vários assuntos e uma certa dose do medo do passado acompanha-os, mesmo que inconscientemente.
7. Escolhemos os nossos políticos e governantes para que eles transformem as sociedades para melhor e para que sejamos cidadãos felizes. Contudo, após chegados ao poder, são eles que mudam e acomodam-se ao poder e aos louvores e benesses que dele advém (para muitos, alcançar e ter poder é um vício insaciável). Infelizmente, são vários os políticos que, sem grande virtude intelectual e ética para se adaptarem à complexidade das circunstâncias, acabam por falhar na sua missão e cair no alheamento da realidade, no excesso de confiança, na convicção de não terem de prestar contas a ninguém (por exemplo, à opinião pública), ou seja, na soberba, na cegueira, no fingimento, na mentira… e por último, também a queda do poder. Sim, “o poder não é eterno” – tal como nenhum cargo é eterno –, e mais tarde ou mais cedo perde-se, e normalmente quem está por perto acaba por apanhá-lo. Esta também é uma das (boas) consequências da democracia, alguns tiveram a sua oportunidade, mas depois desperdiçam-na.
Miguel Alexandre Palma Costa
(in DN-Madeira, https://www.dnoticias.pt/2024/10/25/424743-o-poder-perde-se/)
1. Se, como bem referiu o poeta latino Publius Ovidius Naso, “amanhã não seremos o que fomos, nem o que somos”; se tudo é mudança, pois “tudo cede o seu lugar e desaparece” (Eurípedes); se a mudança – ou o novo – em todas as coisas é desejável (e inevitável) e, portanto, também o é na área da Educação; se não somos prisioneiros do passado e em quase tudo temos oportunidade(s) para experimentar a variação; se as ideias velhas não resolvem os novos problemas ou desafios; se mudamos e “evoluímos, logo somos” (Henri Bergson); então começo este pequeno artigo de opinião por advertir que sobre o seu delicado tema – a Educação –, de modo algum tenho um pensamento e discurso definitivos (acabado) ou, como se diz agora no moderno léxico político, irrevogável.
2. Após o termo de mais uma aula de 90 minutos, na última semana, um pequeno grupo de alunos dirigiu-se-me e um deles colocou a seguinte questão: qual o motivo explicativo do fraco (ou nenhum) investimento no sector da Educação, quer na Região Autónoma da Madeira quer em território continental? Por que não se investe mais naquele que é o grande motor do desenvolvimento pessoal, social, económico e cultural de um país, isto é, na ferramenta mais poderosa que temos para delinear, transformar (e melhorar) tudo o que está à nossa volta? Qual a razão da Educação continuar a padecer dos problemas de sempre e, por esta via, estarmos a condenar as gerações atuais e vindouras a um futuro comprometido e com relevante insignificância? Em suma, porque é que a Educação não é absolutamente essencial e uma prioridade “central” nas políticas públicas de sucessivos governos, e não se tem apostado, efetivamente, nesta área ao longo dos últimos anos?
Por razões de tempo – melhor, escasso tempo, pois tinha outra aula para lecionar –, a minha resposta foi simples e direta: a causa é clara e acessível a quem a quiser ver e apontar: a educação não dá votos, e por isso os nossos governantes pouco ou nada investem neste influente sector, aquele que vos (nos) prepara para a vida, mas que é incompreendido e está distante dos afazeres e preocupações de muitos cidadãos que ainda exercem o direito (e dever) de votar.
3. Depois desta breve elucidação aos alunos, no final do dia e já chegado a casa, procurei encontrar as premissas que justificassem a minha rápida conclusão e, tentarei, nas linhas que se seguem, exibir algumas delas, tais como por exemplo:
a) há alguns anos, António Guterres, atual Secretário-Geral das Nações Unidas (mas primeiro-Ministro de Portugal entre 1995 e 2002) utilizou o slogan “Paixão pela Educação” e, como humanista convicto, acreditou que um país mais formado/educado seria um país melhor. O princípio está correto, mas não vingou, assim como continua a não vingar um volumoso e incessante investimento na escola pública. No seu segundo mandato, que ficou a meio – na sequência de uma derrota eleitoral autárquica do PS, em 2001, e procurando, nas suas palavras, evitar um “pântano político” –, teve três ministros (Guilherme d’Oliveira Martins, Augusto Santos Silva e Júlio Pedrosa) que poucas e boas memórias deixaram. Nas eleições legislativas de 2002, o eleitorado não (lhe) perdoou e foi sucedido por José Manuel Durão Barroso no cargo de primeiro-ministro, mas também abriu as portas à famosa “Coligação Democrática” e deu ao CDS um protagonismo que este decerto não esperava.
b) os estudos de opinião – e uma atenta observação empírica – indicam que os eleitores portugueses pouco (e mal) conhecem as propostas para a área da Educação dos diferentes partidos que concorrem à Assembleia da República. Assim, na hora de escolher os representantes do povo e, por inerência, o partido que irá governar, o valor da Educação para o futuro das gerações vindouras (e do próprio país), não pesa no sentido a dar ao voto. Há outras prioridades, como a saúde, a construção de grandes obras públicas (autoestradas, túneis, novos aeroportos…), o resgate de instituições financeiras ou de empresas de capital público, o emprego, segurança, mas agora também a defesa nacional… não esquecendo a precedência de medidas que conduzam à redução do déficit e das “contas certas”, elemento que, para o atual ministro das Finanças, Fernando Medina, “é central na proteção dos rendimentos das famílias e da capacidade de investimento das empresas”. Sempre a tradicional retórica política!
c) “mito urbano” ou não, certo é que desde 2011 – e após declarações polémicas de um primeiro-ministro – milhares de portugueses emigraram. Só em 2014, contabilizam-se mais de 85 mil emigrantes temporários (Fonte: Pordata). A maioria eram jovens. Todos foram procurar emprego e melhores condições de vida no estrangeiro, mas não esquecemos também o conselho dado aos professores de “procurarem outros destinos”. Por outras palavras, durante anos, a célebre “geração mais preparada de sempre”, aquela que se formou no país e que poderia ajudar a transformá-lo e a renová-lo, que podia votar (e também desse modo contribuir para a alternância democrática), viu-se impedida de viver e realizar os seus projetos profissionais no país onde nasceu e teve de sair para mais tarde “regressar com outra experiência, com outra visão”. Os jovens, muitos com o 12º ano e outros tantos recém-licenciados ou mestrados, aqueles que o sistema educativo ajudou a formar durante décadas, também não “concederam” folgados votos aos políticos do regime, os quais continuam a ser eleitos maioritariamente por cidadãos que estão desinteressados ou alienados dos assuntos/problemas da Educação.
d) construir creches públicas, escolas do 1.º, 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário, mas também universidades ou politécnicos, dá votos. Já ser o “compositor” da fórmula, conduzir, executar e avaliar a política nacional relativa ao sistema educativo (e reformá-lo, isto é, cortar nos custos [lembro que o OE 2023 tem um decréscimo de 7,6% – menos 569,1 milhões de euros – na Educação, face à execução estimada até final de 2022]), assim como articulá-lo, no âmbito das políticas nacionais de promoção da qualificação da população, de educação e com a política nacional de formação profissional, isto seguramente já não dá votos! Aliás, quantos portugueses conhecem o nome do atual ministro da Educação e até mesmo da ministra da Ciência, Tecnologia e ensino Superior? E qual o peso político destes dois ministros no XXIIIº governo constitucional, liderado por António Costa?
e) porque a (minha) memória ainda conserva algumas ideias e factos políticos do passado, recordo aqui, em particular, dois que muito demonstram o desapego pela Educação e o entendimento de que esta área não dá votos: 1.º- o dia 2 de julho de 2018, quando António Costa afirmou que, para serem feitas as obras do IP3, não podia ser recuperado o tempo de serviço dos professores. Quatro anos passados, nem o IP3 tem executadas todas as obras prometidas, nem a recuperação do tempo de serviço foi justamente consignada a estes profissionais da Educação; 2.º em maio de 2019, António Costa garantiu que o seu Governo se demitia caso a votação global, no Parlamento, fosse favorável à proposta apresentada pelo PSD, CDS, Bloco e PCP, que previa a recuperação integral do tempo de serviço dos professores que esteve congelado (9 anos, 4 meses e 2 dias). Ora, depois de toda uma longa e intensa crispação com a classe docente, que em 2021 empregava mais de 150 mil cidadãos (entre o ensino pré-escolar, básico ou secundário), no último domingo de janeiro de 2022, António Costa ganha novamente as eleições legislativas, agora com uma maioria absoluta, que nas suas palavras é “uma maioria de diálogo” e “não poder absoluto”. Costa sabia de antemão que não precisava dos votos dos professores (ou que não os teria) para fazer história e dar a segunda maioria absoluta ao (seu) Partido Socialista.
4. No dia 17 de novembro de 2022 celebra-se o Dia Mundial da Filosofia, umas das mais ‘belas-artes’ criadas pelo ser humano, um elemento perturbador e causador da agitação intelectual (reflexão, pensamento crítico, criativo e independente…) num tempo e mundo pejado de apatia geral ou pacífica indiferença. Ela é, conjuntamente com a Paideia (παιδεία) grega, um dos dois pilares da civilização ocidental. Depois de ler e ficar a conhecer, quem pode esquecer Platão e Aristóteles, Descartes, Kant, Hegel, Nietzsche ou Wittgenstein?
Sim, no trajeto da sua milenar história, a Filosofia teve períodos de ascensão e queda. Alguns vaticinaram a sua morte, mas hoje assistimos a uma “ressurreição” nalgumas universidades portuguesas e está agora a ser ensinada a alguns trabalhadores portadores de outras formações base como forma de estimular o pensamento crítico enquanto fator de competitividade. Parabéns a quem é lúcido e inovador e sabe que esta forma de conhecimento não é só abstrata, como à primeira vista até pode parecer!
Miguel Alexandre Palma Costa
(Artigo de opinião, Diário de Notícias da Madeira,
https://www.dnoticias.pt/2022/11/17/336571-a-educacao-nao-da-votos/)
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