Sabemos que as emoções têm hoje relevante importância – não só para a área de estudo da Psicologia e/ou outras – para a explicação “racional” do comportamento humano e a forma “equilibrada” de como pensamos e agimos, ou seja, excecional consequência/efeito no ato de decidir.
O eminente investigador e médico português no campo das neurociências, António Damásio, aponta que as emoções podem ser definidas de uma maneira muito precisa pois são um conjunto de reações corporais (algumas, muito complexas) perante certos estímulos. Por exemplo, no momento em que sentimos medo, o ritmo cardíaco acelera, a boca seca, a pele empalidece, os músculos contraem-se – (tudo reações automáticas e inconscientes) – modificações/reações fisiológicas que nos provocam o sentimento de medo (A. Damásio, 2004, Cerveu & émotions), e Paul Ekman defendeu a ideia de que as chamadas “emoções primárias” são universais e inatas, ou seja, resultam do processo de evolução das espécies, têm tendência biológica, inata e predeterminada e algumas delas – como o medo, por exemplo, que se revela crucial para assegurar a prontidão de resposta perante situações potencialmente perigosas – manifestam-se desde muito cedo e não dependem da experiência social.
Ora, nos últimos anos, a atividade (e as decisões) política na Europa, mas também no nosso retângulo luso e região insular da RAM, tem destacado um particular papel às emoções na construção da ação política e social, e infelizmente, a “cultura do medo”, que personalidades como Vítor Gaspar e Pedro Passos Coelho (uma fação contemporânea que ainda dirige o Partido Social Democrata, atualmente o maior partido na oposição), e Paulo Portas (ex-líder do CDS-PP e ex-Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros do XIX Governo Constitucional) reavivaram no nosso país – e que fizeram os portugueses retornar à emoção coletiva de à quase 90 anos atrás, «quando António de Oliveira Salazar, também em nome da consolidação das contas públicas, mas num assumido regime antidemocrático, assumiu o poder financeiro e posteriormente a presidência do conselho.
De um modo abreviado, as dimensões simbólicas e afetivas estão hoje mais do que nunca bem presentes na política, e quarenta e três anos depois do fim do regime do medo, «convivemos ainda com ele. A sociedade portuguesa, os portugueses não perderam o medo, ainda que (ou talvez por isso) as novas gerações pouco saibam do passado salazarista» (José Gil, 2004, Portugal, Hoje. O medo de existir).
O medo continua “inscrito” – de forma metamorfoseada ou não, o que o torna quase irreconhecível – na nossa sociedade, atingindo praticamente todos os cidadãos, embora os mais indefesos/frágeis, de uma forma aniquiladora nos seus direitos, liberdades e garantias fundamentais. Este medo subsiste ainda, e na Região Autónoma da Madeira (RAM), onde a mesma força política comanda o “destino do povo” à mais de 40 anos, este medo não é apenas uma reação a um perigo específico, que se prevê temporal, conjuntural, mas uma figura/presença estrutural e cultural que serviu, para analisar, compor e condenar vidas atualmente hipotecadas.
Por outras palavras, aqueles líderes/dirigentes políticos regionais que no passado construíram uma “narrativa” de esperança – com a construção de grandiosas e onerosas obras – alicerçada na fantasia de um futuro melhor, e que exerceram o controlo sobre as massas, que prometeram ascensão económico-financeira, social, avanço(s) na qualidade de vida, na educação, na saúde, meritocracia, ascensão social, etc., tudo debaixo de uma estratégia de dominação, baseada não na esperança, mas no medo, acabaram por deixar uma dívida pública regional de 6300 milhões de euros, um plano de ajustamento – o PAEF – que oficialmente terminou a 31 de Dezembro de 2015, mas cuja austeridade continua ainda hoje a delapidar a vida dos cidadãos madeirenses e portossantenses, ou seja, uma crise financeira, económica e social emanada do dito “sistema” e da falta de regulação/controlo do mesmo.
Agora, em vésperas de mais um ato eleitoral, aqueles que fizeram “renascer” esta cultura do medo na região – o medo da crise económica, do desemprego, o medo de expressarmos espontaneamente a nossa liberdade e direitos, o medo das decisões dos líderes/dirigentes políticos, da falta de cuidados de saúde, o medo de cometer possíveis infrações sociais e/ou morais, o medo das instituições públicas que devem servir os cidadãos, o medo da justiça, etc. – esquecendo-se de onde vieram e o que fizeram (ou não fizeram e deveriam ter feito), agora “pseudorenovados”, são os mesmos que prometem uma lista infindável de coisas, isto é, que aos cidadãos tudo será acessível, fácil e feito, portanto, “chapa garantida”, e que todos ganharemos com os novos “tempos de bonança”, em suma, que o inferno já acabou e que o céu é de graça! O único problema é que o cidadão comum sabe que nada disto bate certo.
Miguel Alexandre Palma Costa
Filosofia
Sociedade Portuguesa de Filosofia
Associação Portuguesa de Fenomenologia
Associação de Professores de Filosofia
Revista Portuguesa de Filosofia
Exames Nacionais de Filosofia - GAVE
Crítica - Revista de Filosofia
Psicologia
Associação Portuguesa de Psicologia
Educação
Direcção Geral de Recursos Humanos da Educação
Secretaria Regional da Educação da Madeira
Sindicato dos Professores da Zona Norte
Sindicato Democrático dos Professores da Madeira