Os gregos ficaram na/para a história por serem notáveis criadores (desde praticamente todos os géneros literários – como a tragédia, comédia, poesia, etc. – mas também podemos apontar o “nascimento” do conhecimento científico, numa variante teórica e não experimental, como uma invenção sua) e a Filosofia, ou melhor, o surgimento do pensamento e argumentação crítica, foram, conjuntamente, uma dessas “criações” que marcaram definitivamente o pensamento europeu, e que hoje se alastra a muitas outras regiões e culturas do globo.
Parece que foi durante o século VII a.C. (com os pré-socráticos, que se dedicavam à investigação das explicações causais e que tentaram formular “teorias” sobre o mundo e a natureza), que nasceu, na Grécia antiga, as primeiras formas de pensamento crítico, cuja principal tarefa era explicar a origem do mundo, da vida e das leis que regem o universo. Como consequência desta invenção e investigação, a magia, os mitos e ritos, as tradicionais superstições/crenças deram lugar a uma abertura cada vez maior ao racionalismo e à especulação abstrata, ou melhor, ao pensar independente, lógico e crítico que começou a surgir com as primeiras “tentativas” de explicação do funcionamento do Cosmos.
No século V a.C., uma cidade, Atenas, foi o ponto de encontro de homens com esta vontade de afirmar o pensamento crítico e de explicar racionalmente a origem das coisas, ou seja, do universo. Contudo, fruto de um caminho que já contava com cerca de dois séculos, este pensamento ou atividade transformou-se, e propunha agora outro racionalismo em que a especulação metafísica seria substituída por sistemas de pensamento voltados para preocupações concretas da realidade humana. A questão central passou a ser o homem como indivíduo, em detrimento do mito e da natureza, e o pensamento crítico (filosófico) mergulha, então, numa “introspeção” acerca dos mais variados temas, como a política, o direito, a religião/espiritualidade, questões sociais, etc. Também por esta altura o pensamento crítico travava a sua primeira grande batalha com o famoso movimento sofista, que opunha à razão, a doxa (opinião), ou melhor, uma retórica e oratória que seriam criticadas por importantes filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles.
Aproximadamente 2500 anos depois – e com toda a evolução cultural, científica, tecnológica, social, etc., conseguidas e compreendidas nestes séculos – a relevância e a utilidade do pensamento crítico continuam a ser hoje fundamentais num clima onde o pensar com “cuidado”, de forma deliberada e fundamentada/justificada (e até o “pensar acerca de como pensar”) é pouco enaltecido e valorizado, pois a imagem, a aparência, o imediato e mediatizado são aquilo que tem interesse e crédito numa sociedade de consumo e do descartável.
Porém, perante todo este cenário contemporâneo que representa um “risco” para o futuro, existem áreas do saber ou disciplinas, no sistema de ensino português (assim como alguns especialistas) como, por exemplo, a disciplina da Filosofia, que consideram necessário adotarmos e desenvolvermos cada vez mais competências de um pensamento crítico. Por outras palavras, para a Filosofia e para a prática quotidiana do seu ensino, é importante identificar, evitar e avaliarmos estereótipos/preconceitos cognitivos, e aqui a aplicação da estratégia/método do pensamento crítico é fulcral. Mas esta também pode servir para reconhecer e avaliarmos não só a informação de que dispomos (e as suas fontes), mas, e sobretudo, para analisarmos os argumentos que utilizamos na expressão do nosso pensamento de forma a evitarmos erros capitais.
No ensino da Filosofia, a prática do pensamento crítico permite-nos atualmente facultar aos alunos não só o reconhecimento das suas faculdades do pensar, mas também o aperfeiçoamento do seu discernimento cognitivo, ético, estético, religioso, político, lógico, etc., o que contribui no presente imediato – e a médio prazo, no futuro – para uma maior capacitação na intervenção/participação ativa dos cidadãos na vida das comunidades a que pertencem.
Em género de conclusão, o ensino da Filosofia, hoje, ao aplicar o método/estratégia do pensamento crítico, permitirá que os alunos façam (e aperfeiçoem) uma análise crítica das suas convicções pessoais, se apercebam da diversidade dos argumentos (e pontos de vista) e das problemáticas dos outros, mas também – e principalmente – que reflitam, problematizem e descubram o carácter limitado de todo o conhecimento, mesmo daquele que hoje é considerado o mais seguro e/ou próximo da verdade. Assim, e pelas razões expressas, o ensino da Filosofia não se deve furtar ao exercício do pensamento e argumentação crítica, pois o seu objetivo é seguramente proporcionar aos alunos um trabalho reflexivo a todos os níveis, ou melhor, “uma atitude de suspeição”, crítica, sobre todo o real, mas simultaneamente uma atitude que lhes permita também tomar um posicionamento compreensivo e reflexivo sobre esse mesmo real.
Miguel Alexandre Palma Costa
(Reflexão elaborada em função da Ação de Formação “Argumentação e pensamento crítico na sala de aula como estratégia de resolver conflitos", Sindicado dos Professores da Madeira, dias 26 de Novembro e 3 de Dezembro de 2016)
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