Ao escutar as palavras inaugurais da comunicação da Prof.ª Ariana Cosme sobre o papel e desafios da escola contemporânea, instantaneamente relembrei o filósofo, professor – e também político – Leonardo Coimbra, que na sua obra O Problema da Educação Nacional (1926), faz uma descrição, à época, mas perfeitamente atual, do estado do ensino em Portugal, e que passo a citar: «os estudantes saem hoje, em regra, tristes, fatigados, sem a alegria de viver que é, no homem, a alegria de compreender, incapazes de reações vitais, criadoras e entusiastas. Porquê? Porque se está praticando uma verdadeira violência moral com essas vítimas, a flor, o escol dum povo, e que amanhã deveriam ter as responsabilidades da vida social. Se um aluno entra numa escola pelas nove horas da manhã e sai depois das cinco, é lícito perguntar-se pelo horário de trabalho, que ao operário manual não consente semelhantes atletismos. Onde fica a saúde, a graça, a alegria, uma hora para a meditação, para a vida interior da imaginação, que é a base da invenção, ou da inteligência, clarificando e ordenando?» (Obras de Leonardo Coimbra, vol. II, Porto, Lello & Irmão Editores, 1983, p. 944).
É verdade, hoje a missão/finalidade(s) da escola é simultaneamente o seu desafio(s), e o educador/professor já não é um mestre à maneira antiga, mas aquele agente social e cultural a quem (quase) tudo se pede e (quase) tudo se exige, ou seja, o professor é agora um “interlocutor qualificado” num processo em contante mudança e em permanente consideração, mas também é alguém a quem é requerida uma aprendizagem contínua, que passa por uma gestão administrativa da escola, uma gestão pedagógica da sala de aula, e um sem número de outras imposições que simultaneamente (e infelizmente) possuem cada vez menos reconhecimento social/público. É um facto – e em total concordância com o argumento da Prof.ª Ariana Cosme – que a incumbência do professor já não pode ser a de um mero administrativo/gestor do espaço escolar e dos programas ministerialmente “arquitetados” e aplicados a alunos radicalmente díspares, muito pelo contrário! O professor hoje necessita de refletir e de tempo para executar essa reflexão, porque o “professor navega à deriva, ou se preferirmos avança como um equilibrista, sem jamais estar certo de ter encontrado um equilíbrio estável tentando conciliar o inconciliável, como misturar água e fogo” (Perrenoud, 2001: 22). Por outras palavras, presentemente o professor necessita de tempo para perceber esta nova realidade, para senti-la, para meditar sobre uma “entidade” que se apresenta indefinida, problemática e nebulosa, isto é, a realidade escola, e nela o professor é ao mesmo tempo educador, ouvinte, formador, psicólogo, pai/mãe, assistente social, técnico/terapeuta, etc., numa lógica e num tempo em que a oportuna dinâmica da globalização determina ainda o problema da educação enquanto um “bem transacionável”, assente numa relação de preço versus qualidade do serviço prestado.
Em género de sinopse, no passado e contemporaneamente, a escola suportou profundas alterações, e ela hoje é já bem diferente de há pouco tempo atrás: é uma escola acessível a todos, massificada, livre, inclusiva, tecnológica/informatizada, com identidade própria, culturalizada, politizada, etc., todavia, e apesar de todas estas “reformas”, resta a velha questão por resolver: o que é uma prática educativa de qualidade e qual a formação que devem ter os professores para que a escola cumpra, no presente, este objetivo primordial?
A necessidade de transmitir conhecimentos e competências, e o desejo de os adquirir, subsistiram e deverão continuar a subsistir enquanto existirem seres humanos e sociedades, mas as mudanças permanecem em curso. Precipitando o futuro, talvez a visão do poeta nos possa ajudar a compreender e ampliar a vocação e o processo de ensinar, e a este propósito, Fernando Pessoa, menciona: «há três maneiras de ensinar uma coisa a alguém: dizer-lhe essa coisa, provar-lhe essa coisa, sugerir-lhe essa coisa. (…) O primeiro processo dirige-se à memória e chama-se ensino; o segundo à inteligência e chama-se demonstração; o terceiro à intuição. A este terceiro processo chama-se iniciação.» (Lopes, Teresa R., Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa, Lisboa, Editorial Estampa, 1990, p. 84).
Miguel Alexandre Palma Costa
(Reflexão elaborada em função das Jornadas Pedagógicas 2015/2016 – Autoridade Profissional Docente: A mudança que se impõe.
Sindicado dos Professores da Madeira, dias 20 e 21 de Novembro de 2015)
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