Este espaço comunicativo foi pensado com o propósito de facultar a todos os interessados um conjunto de reflexões e recursos didácticos relativos ao ensino das disciplinas de Filosofia e Psicologia, acrescentado com alguns comentários do autor.

posts recentes

Ser Professor hoje

(Não) Querer ensinar

Erro(s) e falhas de memór...

(Não) Há vontade?

Ver, Ouvir, Sentir e Pens...

A era dos (ir)responsávei...

Sobre a “Educação inclusi...

Há (ainda) felicidade na ...

Considerações sobre a Gue...

Ruído político

Qualidade(s) ou quantidad...

Conformismo ou (des)obedi...

A Palavra e a Mentira

Ensinar e aprender Filoso...

Alguém (ainda) aguenta?

A importância da Ciência ...

Ecos de (uma) Democracia

Desafio(s) do Futuro: Nat...

Calar, elogiar ou critica...

O decréscimo da participa...

Fazer e responder(e)

Boas ideias e líderes, pr...

Dispersos de um confiname...

Filosofia, Democracia e V...

Aparências e políticos “c...

Não Pensar

Regresso à origem

Esta Região (ainda) é par...

Dispersos de um confiname...

O fator TEMPO

Prometer ilusões

Vírus instruído e pessoas...

A tarefa da Filosofia hoj...

Dispersos de um confiname...

Política de "Cartel"

O pós-coronavírus e os no...

25 de Abril, memória(s) e...

Retorno ao valores

Lição de otimismo

Um Elogio à Ciência

Quanto vale a competência...

Educação (sem) paixão?

A Política do Espetáculo

Deixem(-nos) ensinar!

Duvidar e questionar

Para lá das aparências

Think outside the box

A Política e a construção...

Violência e Política

Ética, Política e Corrupç...

arquivos

Fevereiro 2024

Novembro 2023

Maio 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Setembro 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Novembro 2021

Setembro 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Dezembro 2019

Outubro 2019

Julho 2019

Junho 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Novembro 2018

Outubro 2018

Junho 2018

Março 2018

Janeiro 2018

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Março 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Junho 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Junho 2014

Maio 2014

Maio 2013

Março 2013

Novembro 2012

Outubro 2012

Junho 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Novembro 2010

Outubro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Junho 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Fevereiro 2008

Janeiro 2008

Maio 2007

Fevereiro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3

4
5
6
7
8
9
10

11
12
13
14
15
17

18
19
20
21
22
23
24

25
26
27
28
29


sobre mim:

Em destaque no SAPO Blogs
pub
Segunda-feira, 13 de Abril de 2020

Retorno ao valores

 

 

Valores.jpg

 

1. Na noite de 31 de dezembro de 2007, o ‘Réveillon’ na estação pública de televisão portuguesa, exibido em direto do Pavilhão Atlântico (na época designava-se ainda assim), contou não só com uma das maiores audiências da década, alguns convidados ilustres, mas também – e sobretudo – com o momento da despedida do quarteto humorístico “Gato Fedorento” da RTP, na medida em que chegara ao fim o contrato celebrado entre as partes. Nessa excêntrica noite, as luzes, o som, a alegria, as fantásticas bailarinas, mas particularmente a entrada triunfal de Ricardo Araújo Pereira, José Diogo Quintela, Tiago Dores e Miguel Góis nos invejados diciclos “Segway”, foram a receita mágica para o espetáculo a que se assistiu. Porém, no decurso do mesmo irrompeu uma inédita e singular proposta: passarmos diretamente de 31 de dezembro de 2007 para 1 de janeiro de 2009. Na altura, rimos, gracejamos e brincamos todos, mas esta hipótese (e possibilidade), hoje, dar-nos-ia grande agilidade perante a tragédia que estamos coletivamente a viver e da qual ainda não sabemos bem como sair.

 

2. Declara um provérbio popular que “tudo o que começa mal, acaba mal”. 2020 parece não se ter estreado da melhor maneira. Nos primeiros dias do ano continuavam a chegar notícias de que, apesar da chegada de alguma chuva, os gigantescos incêndios da Austrália prosseguiam ativos (desde setembro de 2019) e que estavam ainda longe de ser dados como extintos; que uma área equivalente à Coreia do Sul tinha sido consumida pelas chamas, 28 pessoas tinham já perdido a vida e que mais de um bilião de animais havia sido carbonizado e milhares de edifícios ficaram destruídos. Analogamente, também chegavam informações relativas a algo que eclodiu e se estava a passar em Wuhan, província de Hubei, na China, o surto de um novo coronavírus (mais tarde denominado SARS-CoV-2) – e de uma nova doença (COVID-19) – que extenuava já profissionais de saúde e esgotava os hospitais de Hankou, o hospital central de Wuhan e o hospital Zhongnan (da Universidade de Wuhan), onde faltava um pouco de tudo, desde meios materiais, humanos, métodos de combate, mas cujas informações difundidas pelos meios de comunicação chineses eram algo contraditórias. A grande nação chinesa estava, naquele período, mais concentrada ainda em preparar os festejos da noite do Novo Ano Lunar – ano do Rato (que segundo o horóscopo chinês antevia boas perspetivas em geral, sendo favorável a nível financeiro, no domínio dos negócios e das iniciativas particulares) – do que em vigiar, detetar, prever e conter uma epidemia que se converteria em pandemia dois meses e meio depois (11 de março).

No entanto, o dia 3 de fevereiro difunde outra desgostosa notícia. Três dias depois do Reino Unido deixar a União Europeia (UE), o pensador, crítico, ensaísta, escritor e professor – um dos maiores e mais prestigiados intelectuais do mundo – George Steiner, falece, na sua casa, em Cambridge, aos 90 anos de idade. Paradoxalmente, morreu afiançando ter assistido à morte da civilização – a ocidental – de que tanto gostava, mas estava muito longe de imaginar o que sucederia no mês seguinte, não só ao Reino Unido, como à Europa da União e a quase todos os países do mundo. No meio das suas múltiplas e grandes obras, por diversas vezes George Steiner questionou a frágil condição humana e a possibilidade do colapso do nosso modelo de sociedade que saiu da ‘grandiosa revolução industrial’, e pergunta: nesta situação, que deveríamos ler? A resposta é quase natural e muito clara: em nome do bom senso, uma passagem em que Aristóteles diz: “Cuidado! Se a tua cidade se torna tão grande que um grito por socorro, algures no centro, não se faz ouvir aos portões, então é porque provavelmente cresceu demais”.

 

3. Os antigos gregos acreditavam que os deuses influenciavam todos os aspetos das nossas vidas e tinham uma perspetiva circular do tempo, a qual garantia que todas as coisas permaneciam na sua essência e identidade, que não existia nem um começo nem fim, ou seja, que tudo é um eterno retorno (nascer e morrer, isto é, a criação e deterioração das coisas é uma forma de repetição das características das próprias coisas/espécies). Talvez isto patrocine um pouco a visão servida por muitos historiadores de que as pandemias são cíclicas, desde os tempos medievais, onde a Peste Negra dizimou um terço da Europa, passando pela pandemia altamente mortífera em 1918-19 (conhecida como “a gripe espanhola”), a gripe pandémica de 2009 (o vírus H1N1), entre tantas outras, e aquela que estamos agora a viver e que prepara, aceleradamente, para ultrapassar as mais de 100 mil mortes em todo o planeta.Mas, para além do recurso ao conhecimento científico e à inovadora tecnologia de que já dispomos para combatermos esta tragédia de saúde pública, crise económica e social (entretanto instalada), que mais será necessário e substancial retomarmos, defendermos e ampliarmos para possibilitarmos uma célere recuperação e funcionamento da economia à escala global, no pós-crise? Numa palavra, valores. Os valores são referências, orientações, os “fundamentos” ou a razão de ser do agir humano. Qualquer escolha ou decisão que tomamos implicam sempre valores, pois eles exprimem aquilo que julgamos que é importante/significativo na nossa vida. Se em pleno século XXI, quase toda a sociedade considerava que vivíamos uma crise de valores, ou pelo menos a falência dos tradicionais, os recentes acontecimentos tornam-na ainda mais evidente. Às categorias morais do subjetivismo/individualismo e relativismo, adiciona-se agora uma Europa (e mundo) que vive “um período de um enorme vazio” (Alain Touraine), de ausência e/ou de atores/lideranças muito fracas, de líderes ou dirigentes sem estratégia, sem direção e sem projeto de futuro. E a esta conjugação que ocasionou a atual crise global, já assombra a eventualidade do surgimento e expansão de mais populismos e novos nacionalismos e autoritarismos (dos estados), pois como sabemos, a fragilidade institucional e a insatisfação quanto à qualidade das democracias depende muito de fatores de natureza socioeconómica. Na conjuntura singular e comum atual, é obrigatório perguntarmos: afinal, onde está a Europa dos valores? O que é feito dos alicerces – princípios identitários – da União Europeia, consagrados nos seus Tratados? O que sucedeu a valores como do respeito pelo pluralismo, tolerância, a solidariedade e igualdade, a coesão e justiça social, a verdade, o respeito pelos direitos do Homem (neste caso particular, pelos dos mais idosos, que com este vírus correm riscos acrescidos), sabendo nós que neste tempo temos de privar-nos de parte da nossa liberdade em nome de um valor superior, a vida. Onde está a ‘União’ – pois “somos todos humanos e, como homens, estamos todos no mesmo barco” (Papa Francisco) – e a memória do passado ensina-nos que “se não ganhamos todos, no fim, perdemos todos” (Pedro Sánchez)! Sintetizando, sem o(s) valor(es) da humanidade estaremos, então, todos condenados a perder esta guerra.

 

Retorno aos valores.png

 

Miguel Alexandre Palma Costa

(artigo de opinião in Diário de Notícias da Madeira, 11.04.2020)


rotasfilosoficas às 19:31

link do post | favorito

pesquisar

 

links